São Paulo, domingo, 30 de março de 1997
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Escolas da França têm cursos de tolerância

Libération
de Paris

ANNETTE LEVY-WILLARD
EM VITROLLES

A "Semana Nacional de Educação Contra o Racismo", que neste ano foi promovida de 17 a 21 de março, é organizada há dez anos por várias associações e tem o patrocínio do Ministério francês da Educação.
Uma circular propõe "unir os alunos de escolas, colégios e faculdades na reflexão sobre esse tema". A visita de Danielle Mitterrand a uma escola de Toulon foi considerada "inoportuna" pelo inspetor de ensino de Var. Como essa experiência foi vivida em outras cidades administradas pela Frente Nacional?
"Você vê essas imagens, e elas são piores do que qualquer filme de horror. É o 'Massacre da Serra Elétrica"', diz um colegial, abalado, passando para seu colega de origem norte-africana as fotos de esqueletos e mortos-vivos tiradas nos campos de concentração da Segunda Guerra Mundial.
A escola de 2º grau Jean Monnet, de Vitrolles, está tendo uma aula de história no âmbito do evento. A cidade fica a dez minutos de distância do campo Milles.
Foi desse campo que 1.928 homens, mulheres e crianças -judeus detidos e internados pela polícia francesa- foram deportados para a Alemanha pelo governo Vichy. Nenhum voltou.
Os estudantes ouvem em silêncio total os depoimentos de dois deportados -um dos quais foi enviado a Buchenwald, e outro, a Ravensbruck- por terem participado da Resistência em Marselha.
As lembranças da Guerra soam estranhas. Os estudantes ouvem que "o governo de Vichy não queria festejar o dia 14 de julho nem a Revolução francesa. Não havia mais República, era a ditadura. Os policiais franceses chegavam a ser piores do que os alemães. Houve 100 mil fuzilados".
O sociólogo Alain Chouraqui completa o testemunho dos resistentes: "Quiseram livrar-se dos judeus, assim como hoje alguns querem livrar-se dos imigrantes. Mas a diferença é que hoje ninguém poderá dizer 'não sabíamos que daria nisso'. Sabemos muito bem no que pode dar".
Os estudantes comentam que aprenderam mais nessas duas horas do que aprendem nos livros de história: "O que vimos é verdade, são pessoas que viveram a Resistência, que estiveram nos campos, que viviam em Marselha", diz Jean-Baptiste, espantando. "Eu poderia ter estado na pele deles." De que lado? "Talvez eu fosse da Resistência ou talvez da maioria silenciosa -mas não teria colaborado com os alemães", afirma.
Os alunos sentem que estão justificados em sua postura anti-racista, nesta escola onde ninguém admite publicamente partilhar das idéias da Frente Nacional. "Aqui as posturas racistas são minoritárias e geralmente são mantidas em segredo", explica Magali, aluna do segundo grau. "Na nossa classe há um sujeito racista, mas toda vez que ele tenta dizer coisas racistas, nós o mandamos calar a boca. Não podemos deixá-lo pensar que concordamos com ele."
O ambiente é de consenso na escola, onde, depois de a prefeita Catherine Mégret afirmar suas posições racistas numa entrevista, 82 dos 120 professores assinaram carta pedindo que o representante da prefeitura deixe de participar do conselho de administração.
Esses estudantes são semelhantes a todos os outros estudantes franceses. Com uma pequena diferença: mais da metade de seus pais votaram na Frente Nacional. "Mas nós não pensamos como nossos pais", dizem.

Tradução de Clara Allain

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