São Paulo, domingo, 6 de abril de 1997
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Mudança foi pequena desde ano 1000

RICARDO BONALUME NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

É fácil olhar com superioridade o ano 1000 quando se está próximo do 2000. Não havia entrega de pizza a domicílio. Não era possível ver fotos de mulheres (ou homens, ou animais) em graus variados de nudez pela Internet.
Também não existiam turistas brasileiros furando fila na Disney World. Não podia haver pizzas perfeitas porque os napolitanos ainda não conheciam o tomate, uma planta nativa das Américas e ainda não globalizada.
Mesmo que existisse uma rede mundial de computadores, o poder da Igreja Católica na Europa impediria a veiculação de pornografia. E ainda não tinham começado as cruzadas, as expedições militares-religiosas de cristãos ao Oriente Médio, que podem ser consideradas um marco na história do turismo ocidental.
É preciso ressaltar que os hunos, os mongóis e os vikings já tinham inaugurado o turismo de massa ("por onde ele passa a grama não nasce", se dizia de um grande líder militar e agente de viagens do século 5, Átila, o huno).
Por outro lado, há indicações de que os russos já estavam inventando a vodka -"aguinha", na sua língua, em plena Idade Média.
O ser humano no ano 1000 d.C. era muito parecido com o de hoje. Tinha basicamente os mesmos defeitos e desejos; só não tinha a tecnologia para obtê-los. Assim como hoje, quase tudo dependia da classe social e do país onde ele nascera.
Na Europa exageradamente cristã, a mudança de milênio foi sinal para que muitos se matassem, como também era costume quando passava o cometa Halley.
Era algo parecido com o que fizeram alguns americanos com a atual passagem do cometa Hale-Bopp. Certamente alguns norte-americanos se matarão à meia-noite de 1999. Os muçulmanos não cometiam essas sandices. Primeiro, porque o ano 1000 d.C. nada significava para eles. Segundo, porque eram uma civilização mais sofisticada que a européia.
Mesmo na China, a superpotência econômica e militar do ano 1000, a sociedade era basicamente agrária. Há camponeses na China colhendo arroz do mesmo modo que seus ancestrais.
Além do grande impacto da industrialização, o que mais mudou nos últimos mil anos é aquilo que hoje virou moda chamar de "globalização", mas que tem suas origens nas caravelas portuguesas que foram bombardear a Índia para obter o comércio de especiarias, descobrindo o Brasil no caminho.
Se o homem pertence a classes sociais relativamente abastadas, come melhor do que há mil anos -nem os reis do ano 1000 poderiam juntar, na mesma refeição, carne vinda de um país, temperos, bebidas, sobremesa e café de mais outros pontos da Terra.

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