São Paulo, terça-feira, 8 de abril de 1997
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Quatro economistas no reino do futebol

LUÍS PAULO ROSENBERG

Acabo de completar uma experiência de pouco mais de três meses, junto com três profissionais de sucesso e fanáticos pelo nosso time, tentando nele impor a racionalidade de gestão.
Escolhemos o papel de transformadores de 110 para 220 volts. Ou seja, ficávamos entre o clube e o patrocinador, decodificando conceitos, zelando pelos interesses de cada lado e administrando os conflitos de interesse que surgiam.
O patrocinador, assustado com o que sabia ser o amadorismo e a frouxidão na gestão dos recursos futebolísticos, exigia de nós a aplicação de critérios de custo-benefício na compra de novos jogadores, que lhe pertenceriam, e a implantação de orçamentos e técnicas de planejamento e controle que assegurassem a integridade de todos os recursos movimentados pelo clube.
A diretoria do clube contava conosco para atrair recursos que revertessem a situação de penúria vexatória em que se encontrava e para assessorá-la na superação de práticas antiquadas de comportamento e gestão.
Nesses poucos meses, muito foi conseguido.
Foi montado um quadro de jogadores cujos méritos profissionais e éticos foram objetivamente avaliados antes de se fazer qualquer proposta.
Nas contratações, todo o cuidado em gastar o mínimo possível, afastando intermediários sanguessugas e batalhando arduamente cada tostão despendido.
Novas contratações, só quando ditadas pelo bom senso; jamais pressionadas por interessados em receber comissões. Salários, prêmios e participações em atraso foram eliminados e nasceu um diálogo franco com comissão técnica e jogadores, que não dispensou a contratação de apoio psicológico e de técnicos em motivação grupal para seminários com os atletas.
O resultado foi a transformação de um grupo de perdedores numa das maiores forças do atual futebol brasileiro.
Iniciou-se também um processo de profissionalização, com um consagrado professor de futebol assumindo a direção geral de todos os níveis do futebol, do dente-de-leite ao profissional, eliminando intermediários e amadores que haviam se encastelado em mais de 40 diretorias envolvidas com o tema.
O marketing do time preparava-se para atacar com agressividade o mercado, após cancelar vários contratos anteriormente firmados e que são surrealisticamente avessos aos interesses do clube.
Gerencialmente, hoje o clube tem um orçamento confiável, que revela claramente recursos e dispêndios programados, ainda que não equilibrados.
Externamente, foi possível equacionar um projeto de construção de um centro de treinamento de Primeiro Mundo, encaminhar a solução para o estádio próprio e participar, com os outros clubes nacionais, da formulação de novos conceitos na venda da imagem e participação nos resultados do televisionamento de jogos.
A má notícia é que vaidades pessoais e interesses menores contrariados uniram-se para inviabilizar a continuidade do experimento. Só o tempo dirá se para o bem ou para o mal.
A boa notícia é que o processo de modernização vai continuar. Por mais mesquinhos que sejam os interesses envolvidos, há hoje um grupo de homens sérios liderando as mudanças em vários clubes e uma consciência tão clara do que se pode alcançar com conceitos empresariais aplicados ao esporte que nada deterá a marcha da profissionalização do futebol brasileiro.
Cartolas serão substituídos por gestores profissionais, patrocínios por co-gestões bem regradas; federações e confederações retrógradas serão esvaziadas por ligas legitimamente comandadas por clubes financeiramente viáveis.
Privatização com ética, em suma, fazendo florescer um negócio que é bom em todo o mundo, menos aqui. Um negócio que afeta profundamente as emoções do povo. E que em benefício exclusivo dele deveria ser conduzido.

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