São Paulo, quarta-feira, 9 de abril de 1997
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Imperfeições; Textos diferentes; Trabalho primoroso

Imperfeições
"Gostaria de assinalar algumas imperfeições da reportagem a respeito da Lei de Licitações publicada em 24/3.
Nitidamente, o quadro 'Principais pontos da proposta' não foi montado a partir de um confronto entre o anteprojeto do governo e a lei 8.666, que ele pretende substituir. Estão presentes os seguintes equívocos:
1) 'será usado o critério de melhor preço, que inclui valor e qualidade'. Errado: a proposta do governo usa a expressão 'melhor preço' para englobar tanto o menor preço (em licitações de obras, serviços, compras etc.) como o maior preço (em leilões). Nada tem a ver com qualidade. O que pretensamente tem a ver com qualidade (mas na realidade não tem) é a introdução de uma 'nota técnica' para classificar concorrentes;
2) 'todas as compras feitas pelo governo federal serão acompanhadas pela Internet'. Errado, no sentido de que para isso não é necessário mudar a lei, bastando um despacho administrativo, ou no máximo um decreto regulamentando o que já está previsto na lei atual. Tanto é que o governo federal já está fazendo isso;
3) 'quem questionar o processo de licitação terá que apresentar provas. Se isso for feito de má-fé, a pessoa poderá ser processada'. Errado. Isso já é assim, e não depende da Lei de Licitações;
4) 'será criado um sistema de registro de preços'. Errado. É o mesmo assunto referido no item 2;
5) 'cria a figura do 'performance bond', garantia de execução da obra ou serviço por meio de seguradora'. Errado. Trata-se de falha técnica do projeto. Embora apareça na proposta do governo, 'performance bond' é apenas uma modalidade de seguro-garantia, que já está presente na lei em vigor;
6) a maior falha do quadro, entretanto, é o fato de não explicitar que o anteprojeto de lei do governo inclui na verdade duas leis, uma para o país todo e outra para a administração federal direta. Todas as informações do quadro em questão se referem a esta última. Para as demais esferas administrativas, bem como para as empresas estatais de todas as esferas (incluindo a federal), valeria um conjunto de normas que, entre uma dezena de outros problemas a meu ver seriíssimos, nem sequer define quando se pode e quando não se pode dispensar uma licitação."
Eduardo Ribeiro Capobianco, presidente da Comissão de Obras Públicas da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (São Paulo, SP)

Nota da Redação - 1) Como o anteprojeto exige uma qualificação técnica, a qualidade do produto ou serviço adquirido seria melhor, segundo o governo; 2) veja nota na seção "Erramos" abaixo; 3) a consultoria jurídica do Ministério da Administração afirma que nenhuma lei prevê a possibilidade de os integrantes da comissão pedirem ao Ministério Público processo contra quem entra com um recurso por má-fé; 4) veja nota na seção "Erramos" abaixo; 5) a figura do seguro-garantia existente hoje tem caráter indenizatório. No caso do "performance bond", a seguradora será responsável pela conclusão da obra. São mecanismos diferentes.

Textos diferentes
"Eremildo é um idiota. Por idiota, imagina que um artigo produzido por uma mesma pessoa deva ter um mesmo texto, ainda que publicado em jornais diferentes. Professor de jornalismo em universidade federal (portanto funcionário público, o que apenas reforça sua condição de idiota), comparava os jornais do dia, na quarta-feira, 2 de abril, para discutir com a turma a cobertura da violência policial em Diadema, quando desejou comentar um trecho da coluna do Elio Gaspari, 'As desculpas da arrogância'.
Por acaso, pegou o texto publicado em 'O Globo'. Surpresa: faltava a informação que havia lido no mesmo artigo, publicado na Folha, e que era justamente a que pretendia destacar: 'No dia 26, quando apareceu a fita (e ela chegou primeiro às mãos da polícia, depois é que foi para as da Globo) (...)'. Leu de novo o artigo em 'O Globo'. Ali constava apenas: 'No dia 26, quando a fita entrou num quartel da PM (...)'.
Mal refeito do espanto, começou a discutir com a turma o quanto aquela pequena alteração era significativa. Pois o mesmo artigo, pouco adiante, afirmava: 'Depois que se viu a fita, fica impossível dizer que não houve crime'. E, se polícia e governo sabiam da fita antes da denúncia feita em rede nacional, não poderiam apresentar senão as 'desculpas da arrogância'.
Cada vez mais convencido do quanto o ensino do jornalismo pode ser estimulante, Eremildo passou a especular: teria a Folha incluído aquele trecho, à revelia do autor? Teria 'O Globo', também à revelia do autor, suprimido esse mesmo trecho, que além do mais indica que a Globo não foi a primeira a saber? E, em qualquer caso, supondo sempre que a alteração foi feita à revelia, provocaria ela no autor a mesma indignação que o levou, por motivos diferentes, mas não menos graves, a trocar 'O Estado de S.Paulo' pela Folha?"
Sylvia Moretzsohn, professora de jornalismo do Departamento de Comunicação do Instituto de Arte e Comunicação Social da UFF -Universidade Federal Fluminense (Rio de Janeiro, RJ)

Nota da Redação - A alteração no texto foi feita a pedido do jornalista Elio Gaspari à Agência O Globo, que a retransmitiu à Folha e "Zero Hora". Inadvertidamente, Folha e "Zero Hora" publicaram a primeira versão.

Trabalho primoroso
"Primoroso o caderno especial Terra. É um dos mais brilhantes produtos jornalísticos já produzidos pela imprensa.
São páginas de forte impacto emocional, editadas com muita competência. Só faltou o crédito dos editores responsáveis pela obra. A eles, meus parabéns."
Laurindo Lalo Leal Filho, professor de jornalismo comparado da Escola de Comunicações e Artes da USP -Universidade de São Paulo (São Paulo, SP)

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