São Paulo, segunda-feira, 14 de abril de 1997
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QUEM GANHA COM O REAL

Já houve quem acreditasse na neutralidade dos planos de estabilização sobre a distribuição de renda. No entanto, hoje está claro que derrubar a inflação leva, também, a mudanças distributivas. O impacto inicial é sempre positivo, e muito. Mais difícil é dizer se a partir desse benefício seguem-se outros, maiores, ou se há riscos e obstáculos que dificultam o resgate da imensa dívida social.
Após o amplo e justo reconhecimento dos efeitos positivos da estabilização sobre a distribuição de renda no Brasil, a pobreza e o desafio da justiça social têm voltado à cena. De fato, os ganhos com a queda da inflação ocorrem uma única vez. São duráveis, mas não estabelecem por si só uma trajetória de redução futura das desigualdades. E o Brasil continua extremamente desigual.
O fim da superinflação elimina uma fonte de marginalização social e de aumento da pobreza. Criar e distribuir mais riqueza, entretanto, é um desafio crescente e nada trivial.
Se é verdade que a estabilização dos preços interrompeu as perdas salariais, a melhora nas condições de vida da população de baixa renda depende em grande medida da oferta de bens públicos como educação, saúde, saneamento básico -para não falar de transferências diretas, como nos programas de renda mínima ou de seguro-desemprego. O estrangulamento financeiro do Estado -fortemente agravado pela política de juros altos- limita essa via de redução das disparidades de renda.
Nesse sentido, ao mesmo tempo em que evitava a corrosão inflacionária dos salários, o Plano Real promovia também uma grande transferência de renda para os detentores de riqueza financeira. Em 1995 e 1996, os juros nominais pagos pelo setor público somaram R$ 97,6 bilhões. No mesmo período, os gastos nominais com a Previdência Social foram da ordem de R$ 75 bilhões.
É verdade que as taxas financeiras já não estão escandalosamente altas como no início do Real. Mas ainda são elevadas e deixaram como herança um pesado endividamento.
Entre os anos de 1993 e 1995, a renda per capita brasileira cresceu 7%. Todos parecem ter-se beneficiado, ainda que os mais pobres em maior medida que a classe média. Serve de alerta, entretanto, estudo elaborado por economistas do Ipea que já constatou um pequeno retrocesso na distribuição de renda em 1996.
Em 1993, os rendimentos dos 10% mais ricos era 6,5 vezes maior do que o dos 40% mais pobres. Tal proporção chegou a 7,2 em 1994. Depois do Real, em 1995, caiu para 6,4. Mas no ano passado, a relação entre a renda dos mais pobres e a dos mais ricos voltou a subir para 6,5.
Com as políticas públicas limitadas pela falta de fundos e sem um crescimento econômico mais vigoroso, a lenta e deficiente redução das desigualdades continua entre as mais dolorosas vergonhas nacionais.

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