São Paulo, segunda-feira, 14 de abril de 1997
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REFORMA NA JUSTIÇA

O governo enviou ao Congresso projeto de lei que disciplina o processo e o julgamento das ações direta de inconstitucionalidade e da declaratória de constitucionalidade, com o objetivo de regulamentar o texto constitucional. O projeto pretende dar consistência legal a procedimentos até agora regulados pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a quem cabe julgar a conformidade de leis com os preceitos fundamentais da Constituição.
Apesar dos pontos polêmicos, o projeto, em linhas gerais, tem sido bem recebido. Entre os pontos apontados como mais positivos está a abertura da possibilidade de participação de certas instituições no debate que precede o julgamento da questão pelo STF. Titulares do direito de apresentar a ação de inconstitucionalidade terão direito de manifestar-se por escrito sobre o objeto a ser julgado. Os ministros relatores do processo poderão também requisitar perícias e informações adicionais a autoridades na matéria e a outros tribunais. Outra novidade, os postulantes da ação poderiam sustentar oralmente a justeza de sua tese no STF.
Três grande temas, porém, têm sido objeto de debate mais acirrado.
O efeito vinculante, previsto por emenda constitucional de 1993 e regulamentado no projeto do governo, é criticado por restringir a participação da magistratura na interpretação da Carta. Uma vez tomada a decisão pelo STF, ela seria estendida às outras instâncias. Mas se deve observar que, pelo menos em matéria constitucional, a norma colaboraria para colocar a devida ordem na atual ciranda de recursos e contra-recursos, muitas vezes oportunistas e de mero caráter protelatório.
Ainda segundo o projeto, o ministro que determina a propriedade do julgamento de uma ação por seus pares terá o poder de rejeitar liminarmente as que careçam de consistência processual, o que é correto, além daquelas que julgasse "manifestamente improcedentes". Nesse último ponto, parece haver um excesso; coloca-se nas mãos do relator o poder de realizar um julgamento antecipado do mérito da questão. É certo que o projeto dispõe que cabe recurso a tal indeferimento liminar, que então seria julgado pelo conjunto dos ministros do STF. Mesmo assim, esse poder adicional do relator pode criar uma pendência desnecessária, o que é contrário ao espírito geral do projeto -tornar mais ágil a Justiça.
A nova lei prevê, ainda nos temas polêmicos, que o STF pode restringir os efeitos de sua decisão ou determinar a data a partir da qual ela terá eficácia, desde que por maioria de dois terços e "tendo em vista razões de segurança jurídica ou de especial interesse social". O STF poderia invalidar, por um certo período, o efeito de determinações de instâncias inferiores, mesmo que tenha reconhecido a constitucionalidade delas, em alguns casos. Assim, certos cidadãos poderiam ter cassado seu direito reconhecidamente justo. Por exemplo, certos indivíduos ou empresas perderiam o direito de reaver o valor de impostos ilegalmente cobrados caso o governo arguisse o "especial interesse social" e tal alegação fosse aceita pelo STF.
No entanto, tais questões poderão ser amplamente debatidas pela sociedade, por meio de seus representantes no Congresso Nacional (felizmente o governo enviou aos parlamentares um projeto de lei, não uma medida provisória). Espera-se, pois, que nesse foro possam ser resolvidas as polêmicas suscitadas pelo projeto e que a Justiça brasileira ganhe um instrumento para se tornar mais ágil e útil aos olhos da população.

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