São Paulo, sexta-feira, 18 de abril de 1997
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O PARTIDO DOS SEM-TERRA

O presidente Fernando Henrique Cardoso deve receber hoje lideranças do movimento dos sem-terra. Nessa reunião específica, o MST pretenderia reivindicar uma ampla alteração no programa de assentamentos do governo. É mais um momento da atuação desse movimento que, abstraídos seus inaceitáveis excessos, tem ajudado a encaminhar uma solução para os problemas no campo.
No entanto, é um sério erro de avaliação política acreditar que uma organização como o MST tencionaria afrouxar suas atividades à medida que lhe fosse prometido um programa de atendimento a reivindicações pontuais. Em primeiro lugar, parece evidente que o governo não poderia atender ao volume das demandas dos sem-terra. Isso só já tornaria claro que, depois da reunião com FHC, José Rainha e João Stédile não voltariam satisfeitos às suas bases.
A questão de fundo, porém, não é essa. Basta observar a extensão das exigências do MST, o caráter da sua organização e a amplitude de seu programa para constatar que esse movimento é político, no sentido mais amplo do termo.
Não se trata aqui de fazer a crítica vulgar que, ao pespegar o rótulo de "político" ao MST, pretende desqualificar as suas reivindicações. Mas é forçoso reconhecer que, muito além de defender a reforma agrária, o MST também é um partido político de esquerda. Ele reprova o programa do governo e condena a estrutura social do país. Convoca mesmo outros movimentos de deserdados da economia, ainda incipientes, a mirarem-se em seu exemplo de atuação.
O MST é uma partido não-parlamentar e anti-sistema, como diria um manual de ciências sociais. É um grupo organizado que pretende intervir no poder político em prol dos setores da sociedade dele excluídos e que propugna por uma ordem sociopolítica diferente. Sua atuação é legítima, se dentro da ordem legal, democrática. Mas, como seu caráter é mais amplo do que o de um simples movimento reivindicatório, é uma ilusão acreditar que ele será apaziguado em reuniões palacianas. O MST é parte de um conflito mais profundo e, dentro dessa perspectiva, o mais provável é que tal embate possa apenas ser administrado.

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