São Paulo, domingo, 20 de abril de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Campeã vive sob suspeita de ter evoluído com drogas

MICHAEL BAMBERGER
DA "SPORTS ILLUSTRATED"

Se tudo estivesse correto, a nadadora irlandesa Michelle Smith seria uma atleta célebre.
Na Olimpíada de Atlanta, no ano passado, ela ganhou três medalhas de ouro e uma de bronze. Ela conseguiu esse sucesso surpreendente aos 26 anos, quando a maioria das nadadoras já está em decadência.
Michelle se tornou a primeira irlandesa a ganhar um ouro olímpico e a primeira atleta a obter uma medalha para a Irlanda na natação.
Ela é bonita, com olhos e dentes brilhantes, e cabelos ondulados.
Você acredita que seria difícil para agências de publicidade tornar tudo isso um pacote? É difícil imaginar um anúncio de página inteira da Aer Lingus (companhia aérea irlandesa) no "USA Today" utilizando Michelle como uma sereia, flutuando sobre as palavras "venha nadar nas minhas águas"?
Não há nenhum anúncio. Nunca haverá anúncio. Nove meses depois de seu triunfo em Atlanta, Michelle é praticamente ignorada fora de seu país. Isso porque, em seus ombros largos, a nadadora irlandesa carrega uma mancha.
Acusação
Em inúmeras reportagens de Atlanta nos dias após as vitórias de Michelle, a imprensa mundial, abastecida por informações de técnicos e atletas norte-americanos, começou a sugerir que nenhuma nadadora de 26 anos poderia obter os resultados de Michelle, a não ser que estivesse utilizando doping.
Essas matérias deixaram a impressão de que Michelle subira ao topo do pódio olímpico, do dia para a noite, vinda do nada.
Na verdade, no final de 95 ela já havia conseguido dois segundos lugares em competições envolvendo as melhores do mundo.
Michelle passou por quatro testes antidoping em Atlanta, como já havia passado por todos os testes a que foi submetida na vida.
Ela realmente havia conseguido um progresso extraordinário, mas três anos antes.
A irlandesa não era ranqueada entre as 25 melhores do mundo em 93. Em 94, era 14ª em uma modalidade e 17ª em outra. Em 95, ela era a 2ª em duas modalidades e 10ª e 13ª em outras duas. E, em 96, venceu três provas olímpicas.
Suas rivais disseram nunca ter ouvido falar de tal progresso em alguém com mais de 20 anos.
Michelle alega que em 93, após se recuperar de uma febre, começou a ter devoção pelos métodos de treinamento de Erik De Bruin -um holandês que tornou-se seu namorado e, cinco semanas antes da Olimpíada, seu marido.
Se Michelle sofreu uma forte febre em 93, como conseguiu estar entre as 25 melhores do mundo apenas um ano depois? Como conseguiu ficar mais forte e com o físico visivelmente mais definido?
Após a Olimpíada, Michelle só participou de uma pequena competição na Irlanda.
O mais importante, e que continua sem explicação, é saber se suas conquistas foram cruelmente manipuladas ou se ela cometeu uma fraude que não foi identificada pelo teste, trapaceando suas colegas -ou pelo menos as que não utilizaram substâncias proibidas.
Michelle Smith merece receber o benefício da dúvida? Dizer que não é chamá-la de mentirosa e admitir que os limites do esporte, sem o uso de drogas, já são conhecidos. E se os limites são conhecidos, o esporte está morrendo. Ou já morreu. (MICHAEL BAMBERGER)

Texto Anterior: Versões
Próximo Texto: Livro ataca Janet Evans
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.