São Paulo, quarta-feira, 23 de abril de 1997
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Poetas beats homenageiam Ginsberg

ADRIANE GRAU
ESPECIAL PARA A FOLHA, EM SAN FRANCISCO

Mais de 2.500 pessoas se reuniram na congregação Emanu-El, em San Francisco, na tarde de domingo, para uma homenagem póstuma a Allen Ginsberg.
O poeta beat, morto em Nova York em 5 de abril deste ano devido a um derrame decorrente de câncer de fígado, foi relembrado por amigos e fãs numa cerimônia que durou 90 minutos.
Precedendo o evento, um grupo vestido de branco e caminhando sobre pétalas amarelas e rosa declamou o poema "Kaddish", escrito por Ginsberg em homenagem a sua mãe.
A cerimônia uniu tradições judaicas e budistas, na maior sinagoga de San Francisco. A prece "Kaddish", que na tradição judaica é lida em homenagem aos mortos, foi repetida pelo público para encerrar a cerimônia, liderada pelo rabino Peretz-Wolf-Pursan.
Em seguida, todos se reuniram no pátio interno e comeram laranjas, enquanto veteranos da cena beat local recitavam poemas.
Ginsberg era de origem judaica, mas aderiu ao budismo, cuja tradição inclui banquetes funerários.
O poeta Lawrence Ferlinghetti, primeiro editor de poesia beat, relembrou a última vez em que falou com Ginsberg.
"Ele pensava que tinha quatro meses de vida, mas tinha apenas quatro dias", disse ele. "Agora, há um enorme buraco no céu."
Ferlinghetti é dono da livraria City Lights e foi preso em 1956 por causa da publicação do poema "Howl", escrito por Ginsberg e considerado o início da estética beat.
Robert Haas leu uma carta escrita por William Carlos Williams contando a Ezra Pound sobre o jovem Allen Ginsberg que ele havia conhecido. "Eu gosto dele apesar de mim mesmo", diz a carta.
Michael McLure, que estava com Ginsberg na noite em que "Howl" foi declamado pela primeira vez na galeria Six em 1955, emocionou-se ao lembrar várias razões pelas quais amava Allen Ginsberg.
"Eu o amava por ter trazido a piedade budista para a nova geração de poetas americanos", encerrou.
Misturando misticismo com recordações literárias, as poetas mais famosas da geração beat também estiveram presentes.
"Como calcular o tamanho da escuridão?", perguntou Diane Di Prima. Joanne Kyger preferiu relembrar as viagens que ela e Ginsberg fizeram pelo Oriente.
Mas foi Anne Waldman quem conduziu a platéia dos risos ao silêncio emocionado. "Allen Ginsberg jamais causou embaraço à China, Rússia, Casa Branca e aos presidente corruptos", lembrou ela.
"Mas Allen Ginsberg causava alívio na dor de viver, com canções humanas que nasceram nas asas de uma perpétua profecia."
Mark Linenthal, professor de inglês da Universidade do Estado de San Francisco, o poeta-ecologista Gary Snider e Andrew Schelling também participaram do evento.
O poema "Morte e Fama", publicado na revista "The New Yorker" que chegou às bancas ontem, revela os pensamentos grandiosos de Ginsberg sobre a morte, após descobrir que estava com câncer. "Quando eu morrer/ Eu não me importo com o que acontecer com meu corpo/ Joguem minhas cinzas no ar, espalhem-nas no East River/ Enterrem uma urna em Elizabeth New Jersey, B'nai Israel Cemetery/ Mas eu quero um grande funeral/ Catedral St. Patrick, igreja St. Mark, a maior sinagoga em Manhattan."

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