São Paulo, sexta-feira, 2 de maio de 1997
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STJ recomenda cautela e só decide sobre liminar 2ª

AUGUSTO GAZIR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro Demócrito Reinaldo, 64, do STJ (Superior Tribunal de Justiça), recomendou ontem cautela ao governo na realização do leilão da Companhia Vale do Rio Doce.
"É até perigoso com um mundo de ação dessas se fazer o leilão, ninguém pode saber quais são as consequências. Eu não vou julgar o mérito, vou dizer qual é o juiz competente para julgar. As ações vão ter a tramitação regular. Isto é, daqui a quatro, cinco anos."
Reinaldo foi escolhido relator do pedido do governo para que todas os processos envolvendo a Vale sejam julgados por um mesmo juiz.
O ministro também tornou mais complicada a pretensão do governo de realizar o leilão ainda hoje. Segundo ele, sua decisão sobre o conflito de competência só deve sair na segunda-feira à tarde.
O ministro disse que, se os 120 processos sobre a venda da mineradora tiverem o mesmo objeto (pedido) -o cancelamento do leilão-, deverão ser julgados por um mesmo juiz. Para ele, "há necessidade de que essas ações sejam julgadas por um juiz único".
"Se todo mundo pede para cancelar o leilão, por exemplo, não adianta fundamentação. Porque não há quem impeça que muita gente vá dar decisão discrepante. Aí é o caso de haver conexão de ações", disse.
A seguir, os principais trechos da entrevista:
*
Pergunta - O senhor acha que é possível decidir sobre a ação do governo amanhã (hoje)?
Demócrito Ramos Reinaldo - Acho muito difícil. Estarei no tribunal praticando outros atos de rotina necessários, como inclusão de processos na pauta. Pretendo trazer esse processo para estudar no fim-de-semana. Não posso fazer isso lá, em cima da perna. Espero que na segunda-feira à tarde eu consiga fazer a entrega desse material.
Pergunta - Como o sr. vê declarações de um ministro do governo (Antonio Kandir, Planejamento) marcando o leilão para amanhã (hoje)?
Reinaldo - Não tomo conhecimento dessas coisas, não vejo, não escuto. Isso não me pressiona. O que me pressiona é somente o cumprimento da lei.
Pergunta - O sr. já tinha visto uma situação com tantas liminares sobre o mesmo assunto?
Reinaldo - Com um número desse tamanho é a primeira vez. Houve o caso da privatização da Usiminas, mas com esse número de liminares só no caso da Vale.
Pergunta - Esse caso é o mais importante que sr. já julgou no STJ?
Reinaldo - Temos ações de muita relevância para o governo, que são julgadas diariamente, como pedidos de indenização de R$ 500 milhões, R$ 600 milhões, que considero mais importantes do que essa (da Vale).
O que pode haver é a protelação do leilão (da Vale do Rio Doce), mas hoje ou amanhã ele terá que ser realizado. A importância nesse caso é política. A publicidade torna a coisa com uma aparência de relevância, sem ter.
Esse leilão pode até ser feito e uma ação dessa ser julgada contrária ao leilão. É até perigoso com um mundo de ação dessas se fazer o leilão, ninguém pode saber quais serão as consequências. Eu não vou julgar o mérito, vou dizer qual é o juiz competente para julgar. As ações vão ter a tramitação regular. Isto é, daqui a quatro, cinco anos.
Pergunta - O porta-voz da Presidência (Sergio Amaral) tem afirmado que os opositores da venda estão usando o Judiciário como instrumento político.
Reinaldo - O Judiciário não está sendo usado como instrumento. O que há é uma Constituição aberta que facilita que qualquer cidadão tenha acesso livre ao Poder Judiciário. Estamos num Estado de Direito e ninguém pode impedir o cidadão de requerer o que ele pretende ao Judiciário. O Judiciário vai decidir de acordo com a lei.
Pergunta - Se o objeto de todas as ações contra o governo for o mesmo, há o conflito?
Reinaldo - Não é conflito. Há necessidade de que essas ações sejam julgadas por um juiz único.
Você pede uma indenização porque quebrei esse vidro (da mesa à frente). O outro pede a mesma coisa. Como é que isso pode ser julgado por dez, 30 juízes? Cada um vai julgar de modo diferente. A motivação poderá até ser diferente, mas se o objeto for o mesmo... O objeto é aquilo que se pede.
Se todo mundo pede para cancelar o leilão, por exemplo, não adianta fundamentação. Porque não há quem impeça que muita gente vá dar decisão discrepante. Aí é o caso de haver conexão de ações. A lei manda reunir as ações.
Pergunta - O sr. defende a reforma do Judiciário?
Reinaldo - Uma reforma profunda. Tive a ousadia de, por intermédio de deputados amigos meus, fornecer informações para isso. A Justiça é cara e demorada. Não tão cara, mas demorada é muito.
Pergunta - O sr. é a favor da privatização?
Reinaldo - Poderia dizer isso como cidadão, mas nem assim quero me manifestar.

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