São Paulo, domingo, 11 de maio de 1997
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Livros decretam o fim de tudo

CÁSSIO STARLING CARLOS
EDITOR-ADJUNTO DO MAIS!

Se depender de um número crescente de autores, o fim demorou, mas aos poucos está chegando. É o que indica o volume de títulos que proliferam nas livrarias dos EUA e da França -notórios centros de modas intelectuais- e pouco a pouco vão chegando ao Brasil.
Por todo lado surgem prenúncios de fins e de mortes, sintomas de uma época encantada pela aceleração e disposta a destruir o que estiver no caminho para dar origem a um mundo novo.
Os livros tratam desde o fim do capitalismo até o fim do mundo, do fim da ciência até o fim do futuro, da morte do dinheiro até a morte da economia.
Os teóricos de "fins" substituem aqueles que na década de 80 metamorfosearam tudo em "pós-tudo". O "pós" se esgotou, e o "fim" ocupou seu lugar, aproveitando a coincidência de três finais -da década, do século e do milênio- no mesmo período.
Para o ensaísta e escritor Teixeira Coelho, "seria exagerado procurar significados históricos nessa onda de livros". "Trata-se de uma idéia que remonta ao século 19, quando Hegel pensou o fim da arte. Hoje, talvez, a fórmula tenha chegado a seu ponto de saturação. Acho que estamos alcançando o fim da idéia do fim".
O início do fim em sua versão contemporânea começou quando o cientista político norte-americano Francis Fukuyama anunciou o fim da história em 1989.
"Ideais audaciosos, altos sacrifícios, impulsos heróicos, tudo se dissipará em meio à rotina trivial e monótona de fazer compras e votar", ironizou em seguida o pensador inglês Perry Anderson sobre a tese de Fukuyama.
Hoje, o que pode ser confundido com mania apocalíptica ou atualização de medos milenaristas muda de aparência quando se examina o conteúdo dessas obras.
A maioria dos autores não está interessada em proclamar destruições. Eles preferem exterminar modelos de interpretação caducos e sugerir alternativas.
É o que se lê, por exemplo, em "O Fim dos Empregos", do norte-americano Jeremy Rifkin. A obra é apocalíptica quando prevê a extinção de categorias profissionais. Mas se torna redentora ao propor políticas capazes de absorver as legiões de excluídos.
Já o cientista Ilya Prigogine encara o fim das certezas como "o ponto de partida de uma nova racionalidade".
Poucos autores apostam no potencial das profecias cataclísmicas. Um deles é o canadense John Leslie, que em "O Fim do Mundo" mistura crenças religiosas e estatísticas científicas para atestar a iminência do Juízo Final.
Idéias como a de Leslie não diferem das que orientam as recentes manifestações apocalípticas de seitas religiosas. Cansados de aguardar o fim, seus membros resolveram promovê-lo por conta própria -ataques terroristas, como a Aum Shinrikyo (Ensinamento da Verdade), no Japão, ou suicídios coletivos, como a Heaven's Gate (Portão do Céu), nos EUA.
Diante dessas opções é preferível reler um velho título de Isaac Asimov, intitulado democraticamente "Escolha a Sua Catástrofe".

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