São Paulo, domingo, 11 de maio de 1997
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Mais violento, novo grupo cria clima de terror no sul do país

ANDREW GUMBEL
DO "THE INDEPENDENT"

A joalheria e loja de peles Papillon é um dos poucos prédios razoavelmente decentes na miserável cidade de Niscemi, na Sicília.
O homem que a construiu, Salvatore Frazzetto, tinha um sonho: montar um empreendimento honesto e atraente nesse canto decadente do sul italiano.
Mas ele se esqueceu da hostilidade dos bandos mafiosos locais, que conseguiram estrangular todas as tentativas de estabelecer empreendimentos privados na região.
Em 16 de outubro do ano passado, dois valentões invadiram a loja. Exigiram dinheiro em troca de proteção e, diante da recusa do dono, o mataram e a seu filho Mimmo, de 23 anos. Antes, porém, os dois foram retalhados a faca.
A viúva de Frazzetto, Agata Azzolina, manteve a loja. Em 31 de dezembro, os mafiosos voltaram ao local e lhe deram uma surra. Ela começou a receber cartas anônimas, exigindo dinheiro.
Os fregueses desapareceram, com medo não apenas dos desordeiros, mas também dos três soldados enviados para protegê-la.
Azzolina era seguida por toda parte. Foi abordada no cemitério, enquanto chorava nos túmulos do marido e do filho. Ameaçaram matar sua outra filha, Chiara, de 21 anos, se ela não pagasse proteção.
No final de março, Azzolina se enforcou. A filha, Chiara, ainda não foi embora, mas está desesperadamente sozinha na cidade. O prefeito, Salvatore Liardo, foi a única autoridade que compareceu ao enterro.
Virulência
A história da família Frazzetto mostra que uma nova linhagem de atividade mafiosa surgiu na Sicília nos últimos 10 anos e está se tornando cada vez mais virulenta.
Os extorsionários e assassinos que agem em Niscemi e nas cidades vizinhas não pertencem à Cosa Nostra, a Máfia siciliana tradicional, com seus códigos de honra e rígida hierarquia.
Eles representam um fenômeno mais selvagem, mais volátil e, em última instância, mais assustador, que os peritos chamam de "stiddari". São membros de uma organização rival da Cosa Nostra, conhecida como Stidda -estrela, em dialeto siciliano. Muitos de seus membros têm tatuagens de estrelas pelo corpo.
Ela floresce nas áreas em que a Máfia não tem tradição, aproveitando-se da recessão econômica para recrutar membros e espremendo toda e qualquer gota de riqueza de regiões remotas como Niscemi.
A Stidda não opera esquemas de proteção de forma sistemática nem tem qualquer influência organizada nas autoridades locais. Ataca as pessoas de forma imprevisível e cria um clima de terror.
Em Niscemi, assassinatos acontecem até na praça principal, sob o nariz da Câmara dos Vereadores.
O medo é palpável. Pessoas desaparecem misteriosamente, carros são roubados e recuperados mediante pagamento, empresários são obrigados a comprar proteção, e há indícios de envolvimento policial nos crimes.
Recentemente, um incêndio destruiu a sala de projeção do único cinema que funcionava em Niscemi. Questionado sobre o caso, o dono do cinema respondeu: "Nada me aconteceu. Absolutamente nada".
(AG)

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