São Paulo, quinta-feira, 22 de maio de 1997
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'Inseparáveis' garante a catarse da classe média

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

A escolha de Eduardo Conde, que ressurge mais velho, com menos cabelo e maior experiência, e com o carisma de antes, conhecido do cinema, é a surpresa e o melhor aspecto de "Inseparáveis".
No mais, confirma um ano de produção fraca para a autora teatral (e de TV) Maria Adelaide Amaral, que já vinha de uma decepção com "Para Sempre", escrita para Paulo Autran.
Como aquela, também essa nova peça traz personagens superficiais, antes caricaturas de classe média do que figuras dramáticas aprofundadas, individualizadas -que é o que alcança de melhor, em raros momentos, o teatro da autora.
Talvez seja o envolvimento maior com telenovelas, neste ano em que escreve a sua primeira, como titular, o que certamente toma muito do tempo e da criação; mas o certo é que não se repetem aqui, nestas duas peças recentes, personagens como o que reportava a seu próprio pai, ano passado.
A exceção, em parte porque o ator se dá bem com um tipo, tem o humor irônico e o distanciamento necessários, é Eduardo Conde como o marido machista de "Inseparáveis".
Conde rompe de vez com o realismo melodramático (sim, derivado diretamente da televisão, longe da tradição realista do século) e sai pela farsa. Se lhe deram uma caricatura, aproveita-se dela.
O mesmo não se pode dizer de Irene Ravache, atriz de qualidade provada em espetáculos recentes, mas que aqui, com um personagem superficial ao limite do ridículo, não alcança o humor, não vence o drama para cair no sarcasmo.
Interpreta uma mulher fútil, uma dondoca, que se agarrou ao casamento desde cedo e que se vê, em certa altura, insatisfeita com a existência. Na interpretação, não vence o realismo de novela, com cenas que fazem lembrar de malograda atuação recente, em texto do empresário Antônio Ermírio de Morais.
Jussara Freire vai um pouco além, como a amiga mais conflituosa de Irene Ravache, a "inseparável" do título; amiga de juventude que fez escolhas mais problemáticas, preferiu a "paixão" à acomodação.
Ainda assim, uma e outra não compõem mais do que um espelho empobrecedor da classe média, que antes satisfaz e facilita uma catarse superficial do que leva a questionar.
Longe da tradição realista, de Tchecov -para citar um autor sempre lembrado diante das peças de Miguel Falabella ou, mais recente, de Domingos de Oliveira-, peças como "Inseparáveis", a exemplo dessas tantas que têm sido vistas no teatro, fogem da crítica e tornam a realidade mesquinha, frívola.
A trama está ali, próxima da realidade, com suas insatisfações, frustrações, mas os personagens tratam de fazê-la aceitável, sem ambição de grandeza, sem maior verdade.

Peça: Inseparáveis
Direção: José Possi Neto
Onde: teatro Faap (r. Alagoas, 903, Pacaembu, tel. 011/824-0104)
Quando: qui a sáb, às 21h; dom, às 19h
Quanto: R$ 20 e R$ 30

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