São Paulo, sábado, 24 de maio de 1997
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Moda evitou a psicanálise, diz estilista

JACKSON ARAUJO
FREE-LANCE PARA A FOLHA

A palestra "Da Inspiração à Finalização de uma Roupa de Alta-Costura" proferida, anteontem em São Paulo, por Christian Lacroix e por seu diretor de comunicação, Jean-Jacques Picart, reuniu estudantes de moda, jornalistas, estilistas e empresários.
O clima foi de descontração e simpatia por parte dos palestrantes, que responderam às perguntas do público sobre criação, economia, marketing e moda no terceiro milênio. Confira a seguir algumas opiniões dos dois.
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Lacroix
"A moda chegou por acaso na minha vida em 78, pois tinha vontade de criar para o teatro. Minha abordagem feminina é teatralizada, queria que o aspecto utilitário da roupa fosse mais lírico."
"Durante a criação, tudo me inspira: a música, uma obra de arte, um cartaz kitsch nas ruas. Coloco tudo num liquidificador e obtenho a imagem da coleção."
"A moda me levou a não fazer psicanálise."
"A alta-costura é um exercício de extrema liberdade, é uma arte aplicada."
"Pouquíssimas roupas de alta-costura são vendidas. As que não são vão para uma espécie de cemitério, como o dos elefantes. Lá as roupas morrem, os tecidos e os bordados também."
"Acho curioso quando vou a NY e vejo nas butiques só as roupas pretas da minha coleção."
"No cinema, adoraria ter trabalhado com Visconti. Quando vejo um filme dele penso: por que não fui eu que fiz isso?"
"Gosto do meu trabalho quando ele vai além da moda. A moda me interessa muito para manter a maison maleável às necessidades do mundo."
"Dos brasileiros, só conheço Versolato. Mas para os franceses ele não é a imagem do Brasil. Vejo que as brasileiras estão muito influenciadas pelo minimalismo."
"Fiquei impressionado com o dinamismo e a vontade de viver dos brasileiros. Na França, mesmo quando tudo está bem, todo mundo continua enojado."
"Nunca na história da humanidade tivemos tantas possibilidades de estar na moda. Não existe mais aquela vontade de criar uma idéia global como quando Dior criou o New Look e ninguém saía de casa sem a saia no comprimento certo e a cintura marcada. Hoje, busca-se o individual."
"Se a pessoa é gay ou quer expressar sua opinião contra o racismo, inconscientemente isso faz parte de sua roupa."
"Temos que pensar sempre na moda como um reflexo político do mundo. No auge da Guerra do Golfo lançamos coleção e não vendemos nada para o Oriente Médio. Quando foi assinado o contrato de paz, todas as princesas árabes foram a Paris comprar roupas."
"Não sei como vai ser a moda do terceiro milênio. Pode ser que seja reacionária, pudica... É a sociedade quem dita a moda. São as pessoas, as ruas. Não somos nós estilistas."
Jean-Jacques Picart
"Como diretor de comunicação, minha primeira visão sobre as roupas é a comercial. Vivemos uma época de grande perversidade por parte da mídia. Quanto maior for o choque visual, mais espaço conseguimos na mídia. Não entendo por que as editoras de moda dão páginas inteiras para roupas como as da Comme des Garçons, com aqueles volumes, se elas mesmas nunca vão comprá-las. O marketing depende do produto, da idéia. Calvin Klein, por exemplo, é a fórmula mais reduzida da idéia de moda, é só produto. Se ele sofrer um acidente, a coleção vai continuar muito bem".

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