São Paulo, sexta-feira, 30 de maio de 1997
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Desempregado paga estabilidade argentina

FERNANDO GODINHO
DE BUENOS AIRES

O modelo econômico adotado pela Argentina desde abril de 1991 deixou de fora alguns setores da sociedade, que não estão usufruindo da estabilidade de preços e dos baixos índices inflacionários.
Nos últimos dois meses, o país vem sendo sacudido por manifestações de desempregados. São as chamadas "puebladas", revoltas populares que utilizam o bloqueio de rodovias federais para protestar contra a falta de empregos.
Na reunião semanal do presidente Carlos Menem e seus ministros, o bloqueio de rodovias federais como forma de protesto pelo desemprego foi um dos temas tratados. Mas o governo federal não anunciou nenhuma medida sobre o caso.
Existem hoje 14 rodovias bloqueadas por desempregados em todo o país.
As "puebladas" estão concentradas na Província de Jujuy (norte do país, próxima à fronteira com a Bolívia), onde 10 rodovias estão cortadas.
No início da noite de ontem, a Justiça argentina determinou o desbloqueio de rodovias federais da Província de Jujuy.
Não há, no entanto, nenhuma previsão de quando isso deve ocorrer. A decisão da Justiça está condicionada ao resultado das negociações entre os manifestantes e as autoridades da Província.
Desemprego
O desemprego é o principal problema econômico da Argentina na atualidade.
Segundo o Indec (Instituto Nacional de Estatísticas e Censos), o desemprego nas 28 zonas metropolitanas do país atingiu 17,35% em outubro de 1996 (último dado oficial disponível) -o maior índice desde o recorde de 18,4% registrado em maio de 1995.
O desemprego em Cutral-Có, cidade da Província de Neuquém (centro-sul da Argentina) que inaugurou as "puebladas" no país, chega a 60%.
A região sofreu com a privatização da petroleira YPF, que após ser vendida demitiu mais da metade dos seus 7.000 empregados.
Em San Pedro de Jujuy, Libertador San Martin e Tartagal (Províncias de Jujuy e Salta), a desocupação chega a 37%, consequência da privatização de empresas de gás e do setor ferroviário, aliada à falta de emprego nos engenhos de cana.
"É a ruptura da esperança. A economia cresce, mas a estabilidade não atinge todos os setores da sociedade", disse à Folha o cientista político Rosendo Fraga, um dos mais respeitados do país.
"Os conflitos poderão retroceder, mas não vão acabar. O crescimento econômico não consegue acompanhar a demanda pelo emprego", analisa Fraga.
Câmbio valorizado
Para o economista argentino Roberto Frenkel, as "puebladas" são o resultado de uma fórmula também adotada no Brasil: sobrevalorização cambial, abertura da economia à concorrência internacional e privatizações.
"É uma combinação funesta que não resulta em modernização. Não há segurança que se chegará a uma situação de melhor emprego. Os manifestantes são pessoas desesperadas, que não têm voz", afirmou Frenkel à Folha.
Apesar do desemprego, os demais índices macroeconômicos da Argentina são favoráveis. No mês passado, foi registrada uma deflação (inflação negativa) de 0,3% nos índices de preço ao consumidor.
Entre abril de 1996 e abril de 1997, a inflação está em 0,6%.
As reservas internacionais do país estão em US$ 27,5 bilhões, e o PIB (Produto Interno Bruto) cresceu 4,4% no ano passado, em relação a 1995.

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