São Paulo, sexta-feira, 30 de maio de 1997
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Descubra Virginia Rodrigues, a novidade

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
ENVIADO ESPECIAL A SALVADOR

Chega nesta semana ao mercado fonográfico uma nova candidata a diva do canto brasileiro, de inédita confluência entre saberes eruditos e populares. Aos 33 anos, a baiana Virginia Rodrigues lança seu disco de estréia, "Sol Negro", trazendo consigo histórico peculiar.
Moradora da periferia de Salvador (BA), é filha de uma feirante e empregada doméstica com um torrador de café tornado vendedor de picolé após aposentado por invalidez (e que morreu há um ano).
Estudou até a quinta série e, dos 12 anos em diante, foi manicure, lavadeira, diarista e cozinheira.
"Cantava desde pequenininha. As pessoas achavam bonito, e eu gostava de me aparecer", conta. "Eu era protestante, cantava no coral da igreja, desde os 12 anos. Aos 17, veio o desejo de me tornar cantora, quando cantei num programa de calouros. Cantei 'Voa Liberdade', do Jessé, que eu adoro."
Mundana
Continuou cantando em oratórios, mas a participação no programa a afastou da religião e a aproximou dos cantores de rádio. "Gostava de Agnaldo Timóteo, Angela Maria, Nelson Gonçalves, Cauby Peixoto. E Caetano, Gil, Gal, Bethânia, Jessé, Gonzaguinha, Milton..."
Embora continuasse cantando em corais, afastou-se da religião -"hoje em dia, não tenho religião, sou de candomblé".
"Daí em diante, fiquei alimentando meu desejo cantando em bares da periferia. Era música, dança, teatro." Foi parar no Bando de Teatro do Olodum, descoberta pelo diretor Márcio Meirelles.
"Eu a vi solando no oratório de Santo Antônio, não consegui parar de chorar. Chamei para participar do bando, na peça 'Bye-Bye Pelô"', lembra Meirelles. Entrou na peça como personagem muda que, ao final, cantava o tema religioso "Verônica", em latim.
Foi essa música que Caetano Veloso a ouviu cantar, num ensaio da peça, iniciando o processo que mudou toda a sua história.
"Eu já tinha perdido as esperanças. A luta e a dificuldade são tantas que você acaba desistindo e partindo para fazer outras coisas."
Mas Caetano, naquele ensaio, se emocionou com "Verônica", que ele cantava na infância, e com a voz de pendor lírico de Virginia.
Ela acabou fazendo pontas -sempre cantando- nos filmes "Jenipapo" e "Tieta" e participando de uma faixa do disco "Âmbar" (96), de Maria Bethânia.
Em seguida, foi contratada pela gravadora Natasha, de que a mulher de Caetano, Paula Lavigne, é sócia. O resultado é o disco que agora chega ao mercado, com repertório que inclui canções de Ary Barroso, Dorival Caymmi, Luis Bonfá e Antonio Maria, Synval Silva, Caetano e Djavan.
"Virginia é um contraponto à vulgarização e ao comercialismo agressivo que dominam a MPB neste momento", define Caetano.
Virginia já planeja seus próximos trabalhos. "Gosto de cantar os spirituals negros. Quero fazer um disco de música negra."
Por enquanto, canta de gospel -"I Wanna Be Ready"- a canção praieira do baiano Dorival Caymmi -"Noite de Temporal".
"Sol Negro" conta ainda com as participações de Milton Nascimento, Gilberto Gil e Djavan.
"Fiquei muito emocionada quando encontrei Milton, as duas vozes tristes se encontrando. Quase minha voz não saiu. Se cantar com ele no palco, acho que caio dura."

O jornalista Pedro Alexandre Sanches viajou a convite da gravadora Natasha.

LEIA MAIS sobre Virginia Rodrigues à pág. 4-3

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