São Paulo, sábado, 7 de junho de 1997
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Apóstolo do Brasil

LUCIANO MENDES DE ALMEIDA

A 8 de maio de 1553, afastava-se do Tejo o grande veleiro que levava ao Brasil Duarte da Costa, segundo governador-geral. A bordo ia um grupo de sete jesuítas e, entre eles, o irmão José de Anchieta. Que emoção possuía o coração deste jovem de 19 anos, que, atraído pelo ideal missionário, entregou-se a Deus, entrando na ordem recém-fundada por Inácio de Loyola?
José nasceu em Tenerife, nas Canárias, a 19 de março de 1534, caçula de 12 irmãos. Frequentou o Colégio das Artes, em Coimbra. Aluno exemplar, magnânimo, talentoso, sofria, no entanto, de fortes dores na coluna, que acabaram por deformá-lo, deixando-o levemente corcunda por toda a vida.
Na esperança de que os bons ares do Brasil lhe fossem favoráveis, o superior religioso enviou-o a Salvador, onde já se encontravam os primeiros jesuítas, sob a direção do grande evangelizador padre Manuel da Nóbrega.
Franzino e doentio, Anchieta sentia-se feliz por realizar, enfim, o seu anseio missionário. Confiante em Deus, após a perigosa viagem, aportava no litoral baiano aquele que Deus escolhera para ser o "Apóstolo do Brasil".
Desde o início, incansável colaborador de Nóbrega, foi por ele chamado para auxiliar na fundação de um colégio, em São Vicente. Na colina, entre o Tamanduateí e o Anhangabaú, ergueu-se a modesta construção. Esse foi o berço da cidade mais dinâmica de nosso país. Era o dia 25 de janeiro de 1554, festa do apóstolo São Paulo.
Anchieta aprendeu logo o tupi e deu-lhe grafia. Escreveu o primeiro dicionário e a gramática da língua. Era exímio catequista e mestre solícito das lições escolares, às quais unia o ensino dos ofícios de carpintaria, lavoura, uso das plantas medicinais e edificação. Sua criatividade levou-o a compor versos, cânticos religiosos, autos sagrados e peças teatrais. Modelo de inculturação, procurava se adaptar à índole e cultura dos indígenas, os quais amava e respeitava.
Ao lado de Nóbrega, foi decisiva sua atuação para a paz com os tamoios. Apresentaram-se desarmados nas praias de Iperoig. Pela virtude e oração, conseguiram a deposição das armas. Quando Nóbrega voltou a São Vicente para propor as condições de paz, Anchieta permaneceu sozinho em Iperoig. Colocou a vida nas mãos de Deus e ofereceu à sua protetora e mãe o belíssimo "Poema da Bem-Aventurada Virgem Maria, Mãe de Deus", com 5.875 versos latinos, nas areias da praia.
Anchieta volta à Bahia, conclui seus estudos de teologia e recebe, aos 32 anos, a ordenação sacerdotal. Auxilia Estácio de Sá na libertação do Rio de Janeiro.
Nomeado superior dos jesuítas, por dez anos, sem medir sacrifícios, visita e anima as comunidades desde São Vicente até Pernambuco.
Seus últimos anos foram dedicados às populações indígenas da Reritiba (ES). Essa cidade, hoje denominada Anchieta, guarda com carinho a cela e a memória do amigo de todos, conselheiro espiritual, pai dos índios e dos pobres.
As virtudes do santo missionário foram reconhecidas a 22 de junho de 1980 pelo papa João Paulo 2º, ao proclamar sua beatificação.
A 9 de junho estaremos celebrando, com gratidão, os 400 anos de falecimento do "Apóstolo do Brasil". Invoquemos nosso protetor, pedindo que abençoe a juventude, promova a vida das populações indígenas e conduza nossa pátria -que tanto precisa- nas sendas da fé, justiça e paz.

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