São Paulo, domingo, 8 de junho de 1997
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O milionário poupa, usa carro velho e roupa barata; Microfritura; CURSO MADAME NATASHA DE PIANO E PORTUGUÊS; Che Cortes; Eremildo, o Idiota, defende os imbecis; A boa safra de Fausto Solano no Bradesco; Há uma greve malandra no ar; Luiz Sávio de Almeida

ELIO GASPARI

O milionário poupa, usa carro velho e roupa barata
Imagine um cidadão percorrendo as vitrines de um centro comercial brasileiro (ou americano). Ele pode achar um paletó de R$ 1.400, um par de sapatos de R$ 350 e um relógio de R$ 500. Pára, namora cada peça e pensa: "É coisa de milionário".
Errado. Só 5% dos milionários americanos já pagaram US$ 1.400 num terno ou mais de US$ 330 num par de sapatos. Metade desses mesmos milionários nunca comprou relógio que custasse mais de US$ 400. De cada dez, só dois têm carro do ano, e nove nunca compraram um modelo que custasse mais de US$ 41 mil (o preço de um Omega CD). A metade se contenta com máquinas de US$ 29 mil (um Santana 2.000 completo).
Um ex-professor de técnicas de mercado da Universidade da Geórgia, Thomas Stanley, botou nas livrarias americanas o resultado de uma pesquisa sobre os hábitos e estratégias das pessoas que têm patrimônio superior a US$ 1 milhão. Seus resultados são surpreendentes.
O milionário americano é uma espécie em expansão. Hoje, há nos Estados Unidos 100 milhões de domicílios. Deles, 3,5 milhões são de pessoas com patrimônio milionário. (Ficam com metade da riqueza nacional.) No ano 2005, deverão ser 5,6 milhões. (Terão 59% da riqueza.)
Esses personagens são muito diferentes do ricaço dos filmes e festas. Stanley publicou sua pesquisa no livro "The Millionaire Next Door" ("O Milionário da Casa ao Lado"), e dela resulta uma lição: conhece-se o rico pela maneira como poupa. Erradamente, a cultura universal identifica o rico pela forma como gasta.
Tomado pelas médias, o milionário americano tem um patrimônio de US$ 3,7 milhões, ganha US$ 250 mil por ano, vive numa casa de US$ 320 mil, tem 57 anos, mulher e três filhos. Trabalha entre 45 e 50 horas por semana e poupa 20% do que ganha. Dois em cada três não têm patrão. Metade deles não viu a cor de uma herança.
Levando em conta que o jabaculê do ex-deputado Ronivon Santiago foi equivalente a quase um ano de trabalho de um milionário, não é difícil perceber que no andar de cima de Pindorama avacalhou-se a cifra do milhão de dólares. Aqui, virou trocado, mas nos Estados Unidos US$ 1 milhão ainda é muito dinheiro.
Stanley oferece alguns critérios capazes de ajudar quem pretende medir seu patrimônio ou, dependendo do cacife, virar milionário. Medir a utilidade do patrimônio é fácil. Basta saber se o cidadão investiu o suficiente (seja no que for) para poder viver dez anos sem trabalhar. Para avaliar o comportamento da pessoa em relação a sua renda e seu patrimônio, a conta se complica. É assim: multiplique toda a renda bruta de sua casa (exceto aquela que deriva de heranças) pelos seus anos de vida.
Divida por dez.
Essa é sua renda líquida.
Num exemplo, um profissional de 40 anos que ganha R$ 5 mil por mês e é casado com uma mulher que recebe R$ 1.000. Os dois têm dinheiro aplicado e ganharam R$ 10 mil. Sua renda é de R$ 328 mil.
Para que uma pessoa possa saber a relação entre sua renda e sua capacidade de acumular riqueza, precisa comparar o tamanho de seu patrimônio (noves fora as heranças) com a renda anual. Se o médico tem um patrimônio duas vezes maior que a renda (R$ 656 mil, no caso), ele se classifica como prodigioso acumulador de riqueza. Se o patrimônio encosta na renda, é um mediano acumulador de riqueza. Se o patrimônio é bem menor, é um subacumulador de riqueza. Essa conta está influenciada pelos hábitos de poupança americanos, mas são exatamente esses hábitos que produzem tantos milionários nos Estados Unidos. Para acumular sem poupar, só com o dr. Ronivon ligando para o governador Amazonino Mendes.
A pesquisa de Stanley mostrou que os milionários têm horror a gastar. Em geral, eles não vivem perto de outros milionários, mas em vizinhanças onde não ultrapassam a marca dos 25% da população local. Foram poucos os milionários que se submeteram de graça às demoradas entrevistas de Stanley. Alguns deles cobraram US$ 250. Outros levaram ursos de pelúcia para os netos.
Só 29% dos milionários têm cartão American Express dourado, mas 43% deles têm o plástico da Sears.
Stanley não conta como se pode virar um milionário, mas dá três indicações para cuidar do dinheiro:
1) as famílias que gastam muito tempo discutindo a compra de coisas caras tendem a poupar menos que as famílias que gastam tempo planejando o orçamento;
2) se você não é rico, mas quer vir a sê-lo, nunca compre uma casa que lhe traga uma dívida maior que o dobro de sua renda familiar anual;
3) os filhos adultos poupam dinheiro na razão inversa do patrimônio que receberam de presente dos pais. Quanto mais ganharam, menos poupam. Quanto menos ganharam, mais poupam.

Microfritura
FFHH está tentando uma novidade culinária, a fritura por microondas. Quer fritar Sérgio Motta sem tocá-lo.

CURSO MADAME NATASHA DE PIANO E PORTUGUÊS
Madame Natasha tem horror a música. Ela socorre os sem-verbo e soube que nesta semana se reúne, com FFHH e tudo, a comissão do 5º Centenário do Descobrimento do Brasil. Ela oferece uma bolsa de estudo preventiva para quem acredita que Pindorama, como a penicilina, foi descoberta. Quando Cabral chegou aqui, já havia perto de 1 milhão de pessoas comendo, bebendo e dormindo. (Alguns deles, antepassados de FFHH.)
Fica melhor dizer que se comemoram os 500 anos da chegada dos europeus. O que não é pouca coisa.

Che Cortes
Está identificado o misterioso tradutor da biografia do Che Guevara escrita pelo jornalista americano Jon Lee Anderson. M. H. C. Cortes é o embaixador Marcos Henrique Camilo Cortes, membro do corpo de conselheiros da Escola Superior de Guerra.
Marcos Cortes fez uma soberba tradução, chegando a corrigir um erro do autor, que atribuiu a renúncia de Jânio Quadros a um golpe militar. O que há de pitoresco no episódio, é que Cortes jamais teve a mais remota simpatia pelas idéias comunistas de Guevara. Pelo contrário. Jamais escondeu sua militante antipatia por tudo o que Che pensava e fazia.

Eremildo, o Idiota, defende os imbecis
Eremildo é um idiota. Ele se encantou com a declaração do ministro da Justiça, Iris Rezende, ao saber do assassinato de três invasores do conjunto habitacional da Fazenda da Juta, em São Paulo, durante um confronto com a PM: "O crime, muitas vezes, é inevitável". O idiota fez do jurisconsulto seu ídolo, mas se decepcionou há poucos dias, quando viu o ministro informando que a frase nasceu em outro contexto. Segundo Iris, sucedeu o seguinte:
"Não houve referência ao episódio da PM de São Paulo quando me fizeram a pergunta. Entendi que queriam saber até que ponto eu me comprometia a extinguir a criminalidade no país. Eu não poderia dizer que vou acabar com a criminalidade nos país, porque seria uma promessa inútil, uma papagaiada. Posso ser tudo, menos imbecil. Eu não chegaria aonde cheguei se fosse ao menos estonteado."
Eremildo está sempre pronto a admitir que, por idiota, é incapaz de entender o que vê e o que ouve, mas, nesse caso, tendo pedido ajuda ao repórter Daniel Bramatti, reconstituiu a cena ocorrida por volta das 12h do dia 20 de maio, no plenário do Senado.
Bramatti acercou-se do senador Iris Rezende, passou-lhe um fax no qual havia uma curta nota relacionada com o incidente de São Paulo e perguntou-lhe se tinha algum comentário a fazer. O senador leu e disse:
"O crime, muitas vezes, é inevitável. Chega a Justiça e manda desocupar. Você não sabe qual foi a reação do desocupando." (O que significa "desocupando", Eremildo não sabe.)
Eremildo magoou-se com o ministro por ter menosprezado os imbecis. Como velho e calejado idiota organizou uma pequena lista de imbecis que já chegaram ao cargo de ministro da Justiça. O idiota se julga capaz de provar a Iris Rezende que seus piores antecessores não foram os imbecis, mas os lesos (como diria o ex-deputado Ronivon) que acobertaram assassinatos e mutilaram as liberdades públicas e os direitos alheios.

A boa safra de Fausto Solano no Bradesco
Subsídio para a história das traficâncias financeiras dos títulos públicos.
Durante os trabalhos da CPI dos Precatórios, vários senadores procuraram entender a real natureza das relações existentes entre o Bradesco e a corretora Boasafra, do afortunado Fausto Solano (aquele em cuja conta um misterioso Renê depositou US$ 9 milhões).
Em abril, durante o depoimento do presidente do Bradesco, Lázaro Brandão, o senador Roberto Requião perguntou-lhe o seguinte:
"O sr. Fausto Solano seria o "dealer", o negociador, ou um corretor, ou um comissário do Bradesco?"
Brandão respondeu:
"Não, não tem nenhum vínculo estreito com o banco. (...) Ele não tinha -no sentido da pergunta- nenhum privilégio dentro da organização."
Um documento de março de 1996 mostra que algum privilégio a Boasafra tinha. Quando encaminhava propostas de negócios nos quais o Bradesco era parte, tinha um papel timbrado cujo cabeçalho estampava, juntos, os logotipos do Bradesco e da Boasafra.
Não era uma impropriedade, apenas intimidade.

Há uma greve malandra no ar
As empresas aéreas estão batalhando um reajuste de tarifas de 7,6%. Dizem que suas planilhas de custos justificam o aumento. Mesmo sabendo-se que as passagens brasileiras estão entre as mais caras do mundo, é possível que tenham razão.
O que elas não devem fazer é argumentar que esse aumento de tarifas é consequência do reajuste dos salários dos aeronautas, marcado para junho. Muito menos dizer que, se não houver o aumento das tarifas, corre-se o risco de uma greve de aeronautas.
Não devem fazer isso por duas razões. Primeiro, porque é uma mistificação. A data-base do dissídio salarial dos aeronautas é dezembro, e em dezembro passado eles aceitaram ficar sem aumento algum por seis meses. Além disso, um aumento de 16% nos salários dos empregados significa um aumento de apenas 3% nos custos das empresas. Relacionar automaticamente reajustes de tarifas com dissídios coletivos é caminho certo para acordar a inflação.
Além disso, não é correto alavancar tarifas com o espantalho das greves. Isso significaria que as empresas de transporte aéreo importaram a tecnologia de seus similares do transporte urbano, que fabricam greves para confundir reajuste de salário com aumento de tarifa.

Luiz Sávio de Almeida
(55 anos, com 30 de estudo da vida alagoana, professor de história da Universidade Federal de Alagoas)
*
Fernando Collor, PC Farias, usineiros caloteiros, Divaldo Suruagy, precatórios falsos. Não é muita coisa para um Estado tão pequeno?
Parece demais porque é uma coisa antiga que entrou num estado terminal. O modelo operacional de poder da elite alagoana se esgotou. Eles comeram tudo. Transformaram o público em privado e foram comendo. Agora, que não sobrou nem migalha, essa elite está procurando amparo público, mas o público não existe mais. Sonegaram impostos e empregaram parentes. Depois, arrumaram empréstimos e não os pagaram. Restou um prato vazio. Isso não é uma peculiaridade alagoana. O Brasil cabe em Alagoas. A diferença é que aqui a praga é crônica.
O que é que deu errado no governo de Divaldo Suruagy?
Ele acreditou na mágica do carisma, e hoje em dia só quem tem carisma no Nordeste é a memória de frei Damião. Ele montou uma fantasia. Para sustentar essa fantasia, acreditou na mágica dos precatórios. Mas, se você olha bem, o que era essa mágica? Era uma tentativa de fabricar recursos públicos para um Estado falido. Estava falido porque comeram tudo e talvez quisessem comer também o dinheiro dos precatórios.
O senhor acha que o governo federal deve intervir em Alagoas?
Do ponto de vista do lascado, aquele sujeito que não consegue emprego e mal come, essa intervenção já devia ter vindo. Mas, se você acha que e elite alagoana não come intervenção branca, está enganado. Já intervieram aqui pelo menos quatro vezes. Tem que ser uma intervenção de que ninguém se esqueça, botando ladrão na cadeia, forçando a devolução do que foi roubado. Dizendo, por exemplo, que os títulos alagoanos podem ter valor legal, mas não têm valor para os lascados. Quem os comprou sabia o que estava fazendo: estava saqueando o povo de Alagoas. A coisa aqui foi tão longe que a gente já parou de se expressar por raciocínios. Estamos só com interjeições, tipo "eta", "pô", ou "danou-se". Se você contar na rua que uma quadrilha de 600 pessoas entrou na agência do Banco do Brasil e roubou US$ 600 trilhões, ninguém vai lhe dizer que isso é um absurdo. Dirão apenas: "Pôôôô..."

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