São Paulo, domingo, 8 de junho de 1997
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Academias discriminam mulher cientista

FERNANDO ROSSETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma mulher cientista tem que ser 2,5 vezes mais produtiva do que um colega homem para receber a mesma nota de avaliação em um projeto de pesquisa. Isso na Suécia, país com maior igualdade sexual do mundo, segundo a ONU (Organização das Nações Unidas).
O estudo, publicado no último dia 22 pela revista científica "Nature", é o primeiro do tipo a ser realizado -já que as agências que concedem verbas para pesquisa argumentam que é necessário sigilo no processo de avaliação do projeto para que ele seja imparcial.
Mas, inconformadas com a rejeição de seus projetos pelo Conselho de Pesquisas Médicas da Suécia (CPM), as duas jovens cientistas Agnes Wold, microbiologista, e Christine Wenneras, imunologista, decidiram analisar o processo de avaliação desse conselho.
Só conseguiram cumprir o propósito porque na Suécia há uma lei de liberdade de informação, que garante o acesso a documentos públicos. Mesmo assim, tiveram que ir à Justiça e, ainda, demonstrar que era mentira do CPM que esses documentos haviam sido destruídos (leia entrevista).
Análise
O resultado da pesquisa -que recebeu o nome "Nepotismo e Sexismo na Avaliação por Pares"- tem provocado repercussões em toda a comunidade científica.
"Estudo sobre viés sexual choca o mundo", diz o título da reportagem sobre a pesquisa publicada pela revista inglesa de divulgação científica "New Scientist".
As pesquisadoras analisaram os 114 pedidos de pós-doutoramento feitos ao CPM em 1995. E, já de início, os dados mostram que pode haver algum viés.
Enquanto 54% dos pedidos eram de homens e 46% de mulheres, das 20 posições de pós-doutoramento concedidas, 80% ficaram com homens e 20% com mulheres.
Em uma primeira análise das notas dadas pelos avaliadores, as duas pesquisadoras descobriram que, em uma escala de 0 a 4, as mulheres recebiam em média 0,25 ponto a menos que os homens por competência científica, 0,17 ponto a menos pela qualidade da metodologia proposta e 0,13 ponto a menos pela relevância do projeto de pesquisa.
Como cada pedido era avaliado por cinco membros do CPM, a pontuação a menos se multiplica na média final.
"Parecia razoável assumir que as mulheres tiraram notas menores do que os homens porque elas eram menos produtivas", dizem as pesquisadoras na "Nature".
Produtividade
As cientistas desenvolveram, então, três parâmetros de produtividade científica para comparar as notas dadas pelos avaliadores com o trabalho dos candidatos.
Foram considerados o número de publicações científicas, o impacto da revista em que ocorreu a publicação (de acordo com o Instituto para Informação Científica dos EUA) e o impacto dos artigos (medido pelo número de citações que recebeu em outros artigos).
"Para uma cientista mulher receber (do CPM) a mesma nota de competência que um colega homem, ela teria que publicar cerca de três artigos a mais em uma revista como a 'Nature' ou a 'Science"', afirma o estudo.
A pesquisa também detectou o mesmo tipo de favorecimento no caso de o candidato ao pós-doutoramento ser conhecido por um dos membros do CPM.
Fatores como nacionalidade, educação básica, área de pesquisa, filiação a uma instituição, experiência no exterior, entre outros, não provocaram essas distorções.

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