São Paulo, domingo, 8 de junho de 1997
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E a ponte caiu...!

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

A ponte quebrou. Disseram que estava velha demais. Acredito em manutenção de menos. Há três anos, os técnicos recomendaram um reparo geral, que nunca foi realizado. Alegaram falta de dinheiro. Creio em falta de responsabilidade.
A ponte dos Remédios precisou rachar para, então, pensar-se em consertá-la. Temos um governo que prefere remediar em lugar de prevenir.
O caos foi geral. São Paulo parou. Muitas pessoas perderam 12 horas no congestionamento. Haja sistema nervoso!
A confusão me levou a reler uma pesquisa que confirma ser o automóvel o transporte mais caro do mundo (Marcia D. Lowe, "Rediscovering Rail", 1993). Trata-se de um veículo que exige grandes investimentos em ruas e estradas; em estacionamentos e praças públicas; em policiamento; em petróleo; em controle de poluição; em hospitais, para cuidar dos estragos; e vários outros. Nos Estados Unidos, gastam-se cerca de US$ 300 bilhões em tais atividades anualmente.
É uma soma fenomenal. O governo norte-americano reconhece o grande erro de ter abandonado o trem em favor dos automóveis e caminhões para transportar passageiros e, principalmente, cargas.
Em contraste, o Brasil festeja a conquista de 25 montadoras e se orgulha de se aproximar de uma produção anual de 2 milhões de veículos por ano. Nossa frota passará de 17 milhões para 20 milhões de veículos em 1999.
Onde estão as vias para acomodar tantos carros? Em São Paulo, não se constrói uma estrada de grande densidade de tráfego, tipo rodovia dos Bandeirantes, há mais de 20 anos. O investimento em vias públicas urbanas também ficou aquém do necessário.
Estamos diante de uma equação que não fecha. O governo estimula o aumento da produção de veículos; mantém estática a rede viária; e insiste em nem sequer conservar os pontilhões.
Os futuristas dizem que, no longo prazo, as cidades vão se descentralizar. O trabalho será realizado em casa ou perto dela. O tráfego urbano diminuirá. E os congestionamentos se reduzirão a um mínimo.
Mas isso vai demorar para acontecer e exigirá somas fantásticas de investimentos. O que fazer no curto prazo? Parar de fabricar automóveis compromete a economia. Investir em grandes projetos é sonho inexequível. Só resta, assim, conservar pontes e rodovias. Isso é bem mais factível. Como é que, de repente, apareceram tantos recursos para consertar a ponte dos Remédios?
Os congestionamentos urbanos representam grandes perdas para a economia. Infelizmente, inexistem cálculos precisos para o Brasil. Mas, nos Estados Unidos, onde o problema é muito menor do que o nosso, estima-se que o congestionamento urbano representa um gasto "per capita" de US$ 750 anuais em decorrência de perda de tempo, aumento da poluição e dispêndio de combustível.
Da receita da União, 40% vão para salários; 25% para Estados e municípios; e 25% para a dívida. Sobram apenas 10% para educação, saúde, segurança, justiça, energia, portos etc. A situação dos Estados é mais ou menos a mesma. Por isso, enquanto as reformas estruturais não chegam, as estruturas das pontes -e de nossa economia- continuarão ameaçadas.

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