São Paulo, terça-feira, 10 de junho de 1997
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Uma lição do jovem Guga para o velho Zagallo

MATINAS SUZUKI JR.
DO CONSELHO EDITORIAL

Meus amigos, meus inimigos, Gustavo Kuerten venceu Roland Garros explorando até o limite a sua vantagem competitiva: a agressividade, a variação de jogo, a juventude, o preparo físico e, sobretudo, a alegria de jogar tênis.
Kuerten adotou o risco como estratégia de jogo e sabia que não tinha alternativa fora de suas características naturais.
A conjunção dos fatores deu um ganho de escala tão fabuloso que o catalão Sergi Bruguera, mais tarimbado, não encontrou um caminho para competir com o brasileiro.
A soma das vantagens de Guga representa também tudo o que um apaixonado quer encontrar no esporte de predileção, daí a imensa simpatia conquistada junto ao público e a mídia internacional.
Se Kuerten tivesse adotado como estratégia de jogo uma mudança radical na sua vocação específica, isto é, se ele, tentando ser mais cauteloso, procurasse um jogo mais conservador, mais defensivo, mais pragmático, mais ao estilo de Bruguera, provavelmente não teria conseguido a vitória em um dos quatro mais importantes torneios de tênis do mundo.
A vitória de Kuerten é, em última instância, também uma vitória para o tênis.
Seu jogo mais agressivo, mais rico em opções, mais emocionante, atrai mais espectadores para essa modalidade esportiva do que o jogo apenas-básico-com-competência de Sergi Bruguera.
Três horas depois, em mesmo solo francês, cerca de 450 km a sudeste da quadra central de Roland Garros, o técnico da seleção brasileira, o velho Lobo do fut Zagallo, tentava, mais uma vez, repetir a experiência que o jovem Kuerten, mais sabiamente do que Zagallo, evitou como erro tático e estratégico.
Zagallo quer que a atual safra de jogadores brasileiros de futebol, parentes próximos do estilo de jogo de Guga, adotem o perfil de jogo de Sergi Bruguera e, com isso, a anulação, ainda no vestiário, da vantagem competitiva brasileira.
Quem esteve mais próximo de Guga, e portanto mais autêntico, mais verdadeiro consigo mesmo, foi o menino Denílson (curiosamente, como Guga, ele respira com a boca aberta), que correu solto, com o prazer de ter a bola sob seu domínio e sempre procurando a criatividade e a ousadia que o espaço ofertado pelos italianos -mais preocupados com Ronaldinho e Romário- lhe propiciava.
Mas, além de Denílson, Djalminha, Giovanni, Romário, Ronaldinho, Paulo Nunes, Edmundo (sem contar Juninho e Rivaldo, que estão de fora, mas poderiam estar dentro) todos são jogadores de futebol no estilo Guga: agressivos e habilidosos, tiram maior proveito do talento na variação de jogadas e no risco de atacar.
O estilo Bruguera deu certo para o Brasil em 94, mas não significa que dará certo sempre -lembre-se que naquela seleção de Dunga, Mauro Silva e Zinho não havia muitas opções de jogo.
Agora, a realidade e a qualidade dos jogadores à disposição da seleção brasileira são outras. São jogadores que estão rendendo bem menos que o potencial, daí que o esquema tático (se é que há algum), paradoxalmente, está atuando contra, não em favor do time.

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