São Paulo, quinta-feira, 12 de junho de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

"Che é o símbolo dos 60", diz Castañeda

HAROLDO CERAVOLO SEREZA
DA REDAÇÃO

Jorge Castañeda, sociólogo e economista mexicano, professor visitante da Universidade de Harvard (EUA) e catedrático da Unam (Universidade Autônoma do México), mudou de área, mas não de assunto. Escreveu a biografia "Che Guevara - A Vida em Vermelho" (referência clara à música "La Vie en Rose"), que a Companhia das Letras lança no Brasil.
É uma biografia ao estilo de um sociólogo: reúne os dados que o autor considera importantes para entender o personagem, mas não abre mão de análises da conjuntura que moldou o biografado e que por ele também foi moldada.
Leia abaixo trechos de entrevista concedida por Castañeda, conhecido no Brasil principalmente por "Utopia Desarmada", à Folha, por telefone.
*
Folha - Por que o senhor decidiu escrever uma biografia?
Jorge Castañeda - Por duas razões: o gênero e o tema. O tema parecia-me de grande pertinência quando iniciei o projeto, há quatro anos. Acreditava que Che voltaria a ter uma atualidade que não tinha então. Queria também escrever algo que fosse suficientemente próximo ao ensaio político. Mas também distinto, meio caminho entre um texto literário, que eu não poderia fazer, e o que já havia feito.
Folha - O sr. escreve que Fidel Castro não era um leitor de teoria marxista, mas de biografias. Também diferencia o historiador do biógrafo. Que tipo de conhecimento uma biografia produz?
Castañeda - Produz, primeiro, o conhecimento de um personagem. Para mim, não se pode fazer a história de um personagem que não seja uma biografia.
A história é, na minha opinião, a história de processos. Creio também que uma biografia produz o conhecimento de uma época, de uma conjuntura, e como ela se reflete na vida de um personagem.
Tentei nesse livro não só contar a vida de Che, mas também algo do que acontecia na Argentina nos anos 40, em Cuba durante a revolução e depois, no movimento comunista dos anos 60. A biografia conta algo a mais que a história do indivíduo, mas é menos que História, com agá maiúsculo.
Folha - Quantas biografias de Che o sr. encontrou?
Castañeda - Não poderia dizer. Creio que são entre 60 e 70.
Folha - Qual a diferença delas em relação à sua?
Castañeda - A grande maioria foi escrita no final dos 60 ou princípio dos 70. Os autores não tiveram acesso aos documentos, testemunhos e interpretações hoje disponíveis. Foram escritas sob o calor dos fatos, com o ponto de vista da época, com uma visão heróica, romântica, gloriosa da revolução cubana e do socialismo, o que não existe mais hoje.
Folha - Por que Che vende hoje mais livros e camisetas do que dez anos atrás?
Castañeda -Além da efeméride, o 30º aniversário, há o fator demográfico. Agora, têm 20, 25 anos os filhos dos que tinham 20 ou 25 anos há 30 anos.
Os jovens de hoje, alguns deles, querem saber quem foi esse personagem, tão importante para seus pais. Uma outra razão é que hoje, creio eu, há uma orfandade de utopias, de símbolos, uma grande nostalgia dos 60, da liberação cultural, existencial, da música. Desse ponto de vista, o renascimento de Che não é distinto do êxito da antologia dos Beatles lançada no ano passado. E Che é o grande símbolo dos anos 60.

Texto Anterior: PUC distribui livros da série "Autores"
Próximo Texto: Herói 'fugia para a frente'
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.