São Paulo, sábado, 28 de junho de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Real bem, economia nem tanto

ABRAM SZAJMAN

Aos três anos de vida, o Plano Real vai bem, mas a economia nem tanto. Vivemos o mais longo período de estabilização monetária dos últimos tempos. Nesse contexto, o país atravessa uma espécie de processo de aculturamento à nova realidade econômica, refratária aos vícios, maus costumes e distorções do cenário inflacionário anterior, tanto no plano da gestão empresarial como na maneira de enfocar o mercado.
Trata-se de uma fase positiva, que tem permitido a incorporação de amplas camadas ao consumo de bens e serviços. Operam-se, também, profundas modificações nas estruturas de mercado, no sentido de aumentar a eficiência em todos os setores produtivos que, lentamente, ajustam-se aos parâmetros de uma economia organizada.
São, portanto, evidentes os ganhos obtidos pela gestão financeira de negócios pessoais e empresas. Aumentou a confiança dos agentes econômicos, internos e externos, na capacidade do governo de superar as dificuldades.
Quanto aos aspectos negativos, alinham-se a partir da resistência do Estado em fazer a sua parte. Ao longo dos últimos três anos, por exemplo, as receitas cresceram, e as despesas mais ainda. Ao aumentar tarifas públicas e alíquotas tributárias, criar novos impostos ou prorrogar a cobrança de outros, o governo nada mais faz do que adiar a eliminação das causas primárias da desvalorização da moeda.
Faltam-nos opções de política econômica. Não temos política fiscal e, da monetária, resta-nos apenas o expediente de elevar, erraticamente, as taxas de juros. A política cambial, por sua vez, amarra o desempenho do comércio exterior. Tudo isso tem gerado um sério gargalo na conta das transações correntes de nosso balanço de pagamentos. Com o crescimento acentuado do endividamento interno, interpõem-se problemas futuros.
Há, ainda, falta total de diretrizes na área da produção. Pela ausência de política comercial, industrial ou agrícola, o empresário está sem referências que orientem suas ações.
Persiste o descompasso generalizado entre os poderes da República. Congresso, Judiciário e Executivo não se entendem no fundamental -ou seja, em torno de medidas que efetivem o ajuste fiscal. A necessidade das reformas carece de consenso.
Em suma, o quadro de estabilidade se mantém como decorrência da competitividade imposta pela abertura econômica deflagrada no início da década. Esse fenômeno disciplinador, porém, traz consequências danosas a empresas e trabalhadores de menor peso econômico. Obriga a sacrifícios imensos: transferências maciças para o setor público, concentração das atividades produtivas e aumento do desemprego.

Texto Anterior: Atenção em todas as frentes
Próximo Texto: A volta ao feijão com arroz
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.