São Paulo, sábado, 5 de julho de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Bem escrita, sentença surpreende

HÉLIO SCHWARTSMAN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Bulas de remédio e sentenças judiciais são gêneros literários difíceis, mesmo quando bem escritas.
As primeiras por sua especificidade (dificilmente a farmacocinética ou a biodisponibilidade da droga x ou y entusiasmam o leitor); as segundas, principalmente na área penal, por sua generalidade.
A criminologia é uma ciência multidisciplinar que envolve desde questões meramente processuais até elementos sociológicos, psicológicos e mesmo considerações filosóficas.
O juiz que queira fundamentar bem sua sentença terá de utilizar-se de termos próprios de todos esses campos não raro formando uma peça estranha cuja marca mais constante é o uso indiscriminado de latinismos, quase sempre inúteis.
Esse não é o caso da sentença condenatória de José Carlos Alves dos Santos.

Mais valia
Bem escrita, a peça surpreende por resgatar conceitos como mais-valia -apropriação "do excedente de trabalho de gente menos favorecida" (pedir que um juiz não seja prolixo também já é demais)-, velhos motes da retórica -"timoneiro para navegantes de águas turvas" (a imagem remonta à Grécia Antiga)- e análises psicológicas aparentemente procedentes -"aliava à conduta social uma vida profana, para satisfazer seu ego, robustecida pelo dinheiro e pelo poder".
José Carlos Alves dos Santos pode até não ser culpado -duas recentes decisões do Tribunal do Júri (a condenação de José Rainha e a absolvição de um dos apontados como responsáveis pela chacina da Candelária) ofenderam ao bom senso-, mas sua condenação encontra fundamentos até mesmo na mais-valia.

Texto Anterior: Leia a íntegra da sentença de José Carlos
Próximo Texto: Para ONG, Senado resiste a direitos humanos
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.