São Paulo, sábado, 12 de julho de 1997 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
Imunidade televisiva
WALTER CENEVIVA
As idéias constantes do parágrafo anterior foram sustentadas em meu livro "Direito Constitucional Brasileiro" (Saraiva, 2ª edição, 364 páginas). Estou convencido, apesar dos corruptos e dos demagogos, de que a prática do Estado democrático de direito, previsto na Constituição, só é possível se a liberdade de atuação dos parlamentares for assegurada. A Carta de 1988 trouxe saudável providência contra o abuso de negar ou não apreciar pedido de licença para processo contra o senador ou deputado acusado de crime, ao determinar que a negativa ou a ausência de deliberação suspende a prescrição criminal enquanto dure o mandato. Retornando o parlamentar à condição de cidadão comum, reabre-se o processo, eliminando-se a sinonímia que a prática brasileira havia estabelecido entre imunidade e impunidade. Nos casos de parlamentares reeleitos várias vezes, a providência torna-se inócua, pois o fato criminoso termina esgotando-se por si mesmo, com mudanças de interesses, dificuldades da prova e assim por diante. Mas foi um passo à frente. Todas as considerações que submeti aos leitores do livro foram pensadas em termos da imunidade clássica, cuja prática precedeu a televisão legislativa. Esta propõe a reavaliação por vários motivos. Objetivamente, em relação ao veículo, pela capacidade de atingir o público e pela teatralidade que lhe é inerente, além da quantificação geométrica dos telespectadores atingíveis, na medida em que os processos de transmissão se aprimorem e a aquisição de receptores se torne cada vez mais barata. O poder de convencimento transmitido no vídeo é outro fator objetivo a explicar o intenso esforço de muitos parlamentares, nas assembléias estaduais, e mesmo municipais, para terem "sua" televisão, sob a razoável desculpa de dar satisfação a seus eleitores. No referente ao número de telespectadores ainda fica evidente que os atingidos pela mensagem televisiva, com a transmissão integral de sessões, discursos, palestras e assim por diante, cresceram muito em número e em heterogeneidade, muitos dos quais sem condições de distinguir o fato de relevante interesse nacional, da manifestação eleitoreira, de dominante aspecto político. A nova preocupação com a imunidade parlamentar leva em conta que a honra, a vida, a memória das pessoas ficam muito mais expostas ao desrespeito, à ofensa, sobretudo quando o parlamentar seja provido de talento histriônico, capaz de -como os bons artistas- transmitir plena convicção à força de suas palavras. Ampliado o alcance do veículo, como fica a imunidade? Ela continua essencial para a prática democrática. Todavia há de ser submetida a algum poder de controle, talvez pela própria Mesa da Casa servida pelo parlamentar, como, aliás, há alguma previsão nos seus regimentos internos, quando de manifestações em plenário. A imunidade plena, no vídeo oficial, pode ser como o remédio que mata o paciente com a cura tentada. A vítima será a democracia. Texto Anterior: Justiça e habitação Próximo Texto: IC acha em roupa de morto resíduo plástico que pode ser de explosivo Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |