São Paulo, domingo, 13 de julho de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Governo teme isolamento e perda de 'dinheiro verde'

XICO SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

A equipe do governo federal que estuda a legislação sobre biodiversidade teme que o país possa criar uma espécie de "Lei da Informática 2", norma que criou uma reserva de mercado radical para produtos brasileiros em 1984.
O temor foi ampliado depois que a Assembléia Legislativa do Acre aprovou, no início deste mês, a primeira Lei da Biodiversidade do país. O texto proíbe a entrada de estrangeiros na floresta amazônica daquele Estado.
Para ter acesso aos recursos naturais do Acre, uma das áreas mais ricas do país, os estrangeiros precisarão se associar a uma empresa ou entidade de pesquisa do Brasil.
Uma lei semelhante, que serviu de base para a redação do texto aprovado no Acre, está em fase de tramitação no Congresso.
É de autoria da senadora Marina Silva (PT-AC) e trata da proteção e cobrança de royalties pelo uso das riquezas genéticas e vegetais.
O projeto, que pode ser alterado por sugestões (emendas) de outros parlamentares, tenta regulamentar determinações ainda da Convenção da Biodiversidade, acordo feito por 144 países durante a Eco-92, realizada no Rio.
O temor da equipe do governo é que, a pretexto de defender o país da biopirataria, o Congresso chegue a um texto ultranacionalista e com uma posição de isolamento.
Biopirataria é a forma como ficou conhecida a saída ilegal, sem o pagamento de royalties, de material genético (plantas, microorganismos etc.) para criar patentes de produtos no exterior.
No momento, a Funai (Fundação Nacional do Índio) tenta cobrar de pesquisadores ingleses, como revelou a Folha, pagamento por remédios patenteados a partir de conhecimentos dos índios kaxinawas, da região amazônica.
O Ministério Público do Acre vai entregar à Justiça, depois de amanhã, denúncia sobre diversos casos de biopirataria.
Para Fernando Dal'Ava, componente da equipe do governo, o país não deve seguir uma linha fechada e inacessível, o que iria contrariar até mesmo determinações da Agenda 21, documento da Eco-92 que trata da biodiversidade, desenvolvimento sustentável e colaboração entre países.
"Existem estrangeiros bons e maus. Não há sentido fechar as portas para todos", disse Dal'Ava, que é chefe do Departamento de Vida Silvestre do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). "Poderíamos incorrer no mesmo erro da Lei da Informática".
O governo federal, segundo apurou a Folha, teme também que uma lei como a aprovada no Acre crie obstáculos para que o país realize acordos de cooperação com bancos e entidades estrangeiras.
Atualmente, países do G-7, clube dos mais ricos do mundo, investem em pesquisas e infra-estrutura de órgãos brasileiros como o Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), de Manaus.
Para o autor da lei aprovada no Acre, deputado estadual Edvaldo Magalhães (PC do B), o controle aos estrangeiros era mais do que necessário. "Pode parecer um exagero, mas vivemos uma espécie de novo colonialismo", disse.
A Assembléia do Amazonas também tem um projeto de Lei da Biodiversidade, ainda a ser votado.

LEIA MAIS sobre biodiversidade à pág. 1-18.

Texto Anterior: Quo Vadis
Próximo Texto: Cientista defende política eficiente
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.