São Paulo, domingo, 20 de julho de 1997
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Duelo com Maluf anima Covas para 98

ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O governador Mário Covas (PSDB) diz que não é candidato, mas está candidatíssimo.
Surpreendentemente bem-humorado, cita de cor uma pilha de números de seu governo, reclama das restrições aos candidatos que ocuparem cargos executivos e até faz sutis provocações sobre seu virtual adversário Paulo Maluf.
Ao saber que o presidente Fernando Henrique Cardoso estava animado com a sua perspectiva de recuperação nas pesquisas de opinião, até prevendo sua vitória em 98, Covas reagiu: "E quem disse que vou ser candidato?"
Numa entrevista à Folha, na sexta-feira, ele disse várias vezes que não vai disputar a reeleição. Depois, admitiu que "mesmo as mais firmes determinações podem mudar com um tropeção". E especificou, rindo: "Concorrer contra o Maluf, por exemplo, poderia até me motivar".
Para tentar encerrar o assunto, repetiu um expediente usado durante as negociações para sanear o Banespa: "Vou fazer uma promessa para Nossa Senhora de não falar mais sobre reeleição".
Horas depois, recebia para jantar, no Palácio dos Bandeirantes, representantes do PFL paulista na Assembléia Legislativa e na Câmara dos Deputados.
O PFL participou do início do seu governo com duas secretarias. Foi sumariamente afastado ao aderir à candidatura Celso Pitta (PPB) à prefeitura da capital, no ano passado.
Agora, os pefelistas são presença quase certa na campanha de Maluf. Mas não querem se precipitar fechando as portas à de Covas antes do tempo -ou seja, de pesquisas mais consolidadas sobre as chances de cada um.
Em resumo, o PFL não recusa Covas a priori, nem Covas recusa o PFL.
Dados de campanha
Mário Covas fez no governo de São Paulo uma trajetória oposta à de Divaldo Suruagy (PMDB) em Alagoas: endureceu no início, para tentar colher os frutos, ou os votos, no final.
Meses depois da posse, ele enfrentou uma chuva de ovos em Carapicuíba, como símbolo do mau humor de todo o funcionalismo do Estado.
Havia pouco antes proibido o pagamento de férias e de licenças-a-prêmio em dinheiro. Era o início de um processo de enxugamento da máquina que resultou na demissão de 126 mil funcionários.
"Ou você coloca a casa em ordem ou não governa. E isso inclui você frustrar as expectativas do imaginário de quem o elegeu", diz ele, lembrando do tempo em que era execrado em praça pública e seus índices de popularidade caíam sem parar.
Hoje, Covas continua mal nas pesquisas, mas o último levantamento do Datafolha, em junho, registrou que a aprovação ao seu governo oscilou de 27% para 30%.
Ele parece uma caixa registradora cuspindo números do que considera positivo em seu governo: o desempenho das empresas estatais, as salas de aula, as obras recomeçadas.
Segundo ele, a construção de Porto Primavera, na fronteira oeste do Estado, emprega 4.500 homens; as ações da Sabesp cresceram mais de 6.000%; as empresas de energia (Cesp, CPFL e Eletropaulo) foram saneadas e suas ações tiveram um acréscimo de R$ 7,5 milhões etc. etc. etc.
Ele continua jurando que não é candidato, mas promete que "até o final de 98 não vai faltar água numa só casa na área metropolitana de São Paulo".
Depois, acrescenta: "E vou retomar o ritmo de investimentos sem recorrer a dívidas. O ciclo do endividamento está encerrado".
Como sempre se dizia contrário à possibilidade de reeleição do presidente e dos governadores, ele agora prega: "Se o sujeito pode ser candidato, e sem se desincompatibilizar do cargo, ele também deve poder fazer tudo o que fazia antes da campanha".
Exemplo: continuar viajando, no mínimo um dia por semana, pelo interior do Estado.
"O uso da máquina deve ser proibido antes e durante a campanha. É uma proibição permanente, e não porque o governador é candidato."
Ele também já reuniu o secretariado para fazer um balanço sobre quem ficaria e quem sairia do cargo para as eleições de 98. Secretários de Estado costumam ser potenciais candidatos ao governo, mas, surpreendentemente, ele fez uma pergunta específica: quem seria candidato a deputado.
Fernando Henrique
Covas sempre se vangloria de ser "transparente", de não promover encontros políticos sigilosos. Entretanto, ele foi o anfitrião de um jantar considerado intrigante, na segunda-feira passada.
Participaram dois outros fundadores do PSDB, o ex-senador José Richa e o ex-deputado Euclides Scalco, do Paraná. Com eles, o senador Pedro Simon (PMDB-RS), que tem sido sistemático crítico da relação de Fernando Henrique com o PFL.
Recentemente, Simon perguntou em artigos e entrevistas: "Há quanto tempo o presidente não conversa sobre política com os velhos companheiros, como o Covas, o Richa e o Scalco?"
O governador não quis falar sobre o jantar -"foi coisa de amigos"-, mas a Folha apurou que eles concluíram, mais ou menos, o seguinte: o Plano Real ainda é um sucesso, o governo tem um desempenho razoável e "o Fernando Henrique não é nenhum Collor".
Logo, a intenção deles é se aproximar mais do presidente, tentando reduzir a importância política que o PFL tem hoje junto a ele.
Faltou combinar com "o adversário", pois só a presença de Simon no encontro já é suficiente para acender a desconfiança, no Palácio do Planalto, sobre os reais motivos da conversa.
Covas desmente qualquer aborrecimento recente com o presidente. Diz até que ele tinha todo o direito de se encontrar com Maluf no Palácio da Alvorada, e na véspera de seu depoimento à CPI dos Precatórios, sem lhe contar.
Só aproveita para uma provocação rápida: "Aliás, com aquilo tudo, ninguém notou que o Maluf acabou não indo depor".
Como efeito imediato da conversa de Fernando Henrique com Maluf, Covas disse, meio sério, meio de brincadeira: "Nunca recebi tanto elogio, desde que estou no governo. Acho que foi minha melhor fase na mídia".
O governador também diz que não se aborreceu porque o ministro Sérgio Motta (Comunicações) "roubou a cena" de um recente encontro montado pelo PSDB, em São Paulo, a título de pré-lançamento de sua candidatura.
"Que pré-lançamento, que nada! Era só uma festa do partido", desconversa, sem comentar a idéia anunciada na ocasião por Motta, de um plebiscito em 98 sobre a reforma política.
"Quem sou eu para disputar lide com o Serjão?", riu Covas, citando um jargão jornalístico que significa o primeiro e mais importante parágrafo de uma reportagem. "Aliás, ninguém poderia disputar", disse Covas.
Parlamentarista convicto, Covas adverte que o plebiscito sobre a mudança do sistema de governo foi há muito pouco tempo (93).
Defende, no entanto, que a discussão seja retomada independentemente de haver ou não críticas à "eternização" de Fernando Henrique e do PSDB no poder.

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