São Paulo, domingo, 20 de julho de 1997 |
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Brasileiro vira 'peão' em fazenda nos EUA
LUCIA MARTINS
A Folha ouviu o depoimento de cinco brasileiros que fizeram o estágio e contam histórias semelhantes, apesar de terem sido mandados para os EUA em épocas diferentes e para fazendas distintas. Todos foram atraídos por anúncios em jornais ou panfletos distribuídos em faculdades em que a empresa diz que o estágio oferece uma oportunidade para estudantes ou recém-formados em agronomia, veterinária ou zootecnia conseguirem ganhar experiência em fazendas modernas. Mas, chegando lá, os brasileiros são obrigados a trabalhar até 17 horas por dia em tarefas rudimentares, como limpar currais, lavar baias de porcos, pintar paredes e carregar sacos de ração. As condições de vida nas fazendas também lembram as de um escravo, segundo o relato dos brasileiros. A maioria afirma que dormia em locais "não-habitáveis", fazia apenas duas refeições por dia e não tinha nenhum tipo de contato com a família norte-americana. Durante todo o tempo que passaram nas fazendas, os brasileiros afirmam que não tiveram nenhum tipo de treinamento ou aulas sobre o funcionamento da fazenda que justificassem os cerca de US$ 2.000 pagos pelo estágio. Sem vistos O trabalho intermitente (não há folgas nem nos finais de semana) e as condições de vida não são os únicos indícios da escravidão. Além de serem obrigados a comprar passagem só de ida, os estagiários têm seus vistos retidos por representantes da associação assim que desembarcam nos EUA. "Estava com medo porque não falava bem inglês e estava no meio de uma fazenda sem ter como sair de lá", conta o agrônomo Durval Rosa Borges Júnior, 23, que participou do programa no ano passado e "fugiu" após um mês. Como Borges Júnior, o zootécnico Carlos Saviani também chegou a trabalhar 17 horas por dia. Começava às 3h da madrugada e ia até as 20h, ordenhando vacas e limpando currais. Mas o que o convenceu a escapar do estágio foi o dia em que foi obrigado pelo fazendeiro a cortar grama embaixo de uma chuva de gelo. "Humilhação tem limite. Era um inferno. Dormia mal, comia pouco e trabalhava muito." Termo A empresa que recruta os brasileiros no Brasil tem sede em Ituiutaba (750 km de Belo Horizonte, Minas Gerais). A The Fellow Ranchers International não apenas sabe que os brasileiros são forçados a trabalhar mais do que 8 horas (carga horária máxima de um estagiário, segundo a lei brasileira), como pede que os candidatos -antes de sair do Brasil, mas após pagar as taxas- a assinar um termo em que afirmam estar cientes sobre a possibilidade de trabalhar "mais de 15 horas". O caso já chegou ao Ministério das Relações Exteriores, que afirma estar aguardando informações do governo dos Estados Unidos para tomar providências. "Dependemos das autoridades norte-americanas para saber o que realmente está acontecendo e saber se a denúncia procede", disse André Santos, da assessoria de imprensa do Itamaraty. Santos afirma que, se for constatado abuso, o caso será enviado para o Ministério da Justiça. Texto Anterior: 50 fatos do Relatório Próximo Texto: Entidade alega transparência Índice |
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