São Paulo, domingo, 20 de julho de 1997
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Boataria é combustível na busca do lucro

LUIZ ANTONIO CINTRA
DA REPORTAGEM LOCAL

O ministro das Comunicações, Sérgio Motta, acaba de perder o cargo. A Argentina aplicou uma maxidesvalorização de 30% no peso e o governo FHC cogita fazer o mesmo com o real.
Se você ouviu uma dessas "notícias" na semana passada, esqueça. Foi tudo boato, essa espécie de combustível ideal para um esporte muito praticado no mercado financeiro, a especulação.
Todos os três citados acima correram as mesas de operações de bancos e corretoras e certamente foram responsáveis por prejuízos -mas também, e é daí que vem a força da boataria, por lucros.
Um deles pelo menos -o da iminência da desvalorização do real- cruzou fronteiras, indo derrubar as cotações lá na Bolsa de Valores de Buenos Aires. Surgiu no início da semana e, reicindente, voltou a fazer estragos na sexta.
Nas duas ocasiões, a Bolsa argentina fechou em queda e as agências internacionais de notícia informaram: os investidores ficaram ansiosos com o rumor de que o Brasil havia mexido no câmbio.
Alguns dias antes, por ironia, havia circulado no mercado brasileiro boato semelhante, dando conta que a Argentina que teria optado por desvalorizar o peso.
Nesse caso, o resultado foi agravar a queda da Bolsa paulista, que já caía com a crise na Ásia.
A unir os dois episódios está um dos pré-requisitos para um bom boato, ou seja, para aquele boato que pega, como se diz no mercado financeiro, que é manter ao menos um pé na realidade.
Isso porque entre analistas do mercado financeiro e economistas há o consenso de que o câmbio, tanto na Argentina como no Brasil, está valorizado, ou seja, as cotações estão sendo sustentadas artificialmente.
A própria forma como são fechados os negócios financeiros facilita o sucesso dos rumores.
Ali um operador tem segundos para "digerir" uma informação que acaba de saber e decidir a que preço, afinal, deve vender um lote de ações ou fechar um contrato de câmbio para entrega em setembro.
Ruídos
Parente próximo do boato, o ruído de comunicação é outro parceiro constante desses períodos em que a instabilidade toma conta.
Foi o que ocorreu na terça-feira passada, quando o ministro Sérgio Motta criticou o diretor do BC Gustavo Franco, responsável pela política cambial do governo.
As agências informaram: o ministro Motta critica Franco. "A crise (nos países asiáticos) mostra que o Gustavo Franco está errado", foi o que o mercado "ouviu" da boca de Motta, nos painéis de notícias "on line".
A leitura feita pelos investidores foi: crise no comando do governo, mudanças no câmbio. E as cotações caíram mais ainda na Bolsa.
Fechado o mercado, o ministério informou que a questão era apenas o uso do dinheiro da privatização.
Dois dias depois o mercado se vingou: lançou o boato da queda do ministro Motta.

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