São Paulo, sexta-feira, 25 de julho de 1997
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Um mergulho no imaginário sertanejo

JOSÉ GERALDO COUTO

É impossível avaliar "O Sertão das Memórias" com os mesmos critérios com que se encara, por exemplo, uma produção norte-americana.
O filme do cearense José Araújo é uma obra tão pessoal e original que não tem parâmetro para comparação, embora faça o espectador lembrar, aqui e ali, de Gláuber Rocha e Pasolini.
Uma sinopse pálida e enganadora do filme diria que ele mostra a caminhada sertão adentro de um casal de velhos (Antero Marques Araújo e Maria Emilce Pinto, pais do cineasta).
No caminho, eles se deparam não apenas com seu passado de sertanejos, mas com o imaginário ancestral do próprio sertão, povoado de figuras bíblicas e remotas tradições populares.
Convivem então dois planos no filme: o do sertão atual e real, castigado pela seca, explorado pelos poderosos, e o do sertão atemporal do sonho, dos arquétipos, do inconsciente coletivo.
Embora o trânsito entre esses dois mundos se dê às vezes de maneira um tanto mecânica, com as figuras bíblicas servindo de metáforas da situação contemporânea, o filme é de uma beleza áspera e única.
Com suas surpreendentes imagens em preto-e-branco e sua inspirada trilha sonora (de Naná Vasconcelos), arrebatou prêmios em festivais como o de Sundance (EUA) e o de Berlim.
O filme foi todo rodado na região da pequena Miraíma (CE), cidade natal de José Araújo, que saiu de lá na adolescência para estudar no seminário em Fortaleza e depois trabalhar em cinema nos Estados Unidos (com diretores como Percy Adlon e Greg Nava).
Radicalmente autoral, "O Sertão das Memórias" é o resultado e a tradução dessa trajetória única.

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