São Paulo, domingo, 3 de agosto de 1997
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O PT e as denúncias sobre a Cpem

PAUL SINGER

Tendo feito parte da Comissão Especial de Investigação das denúncias feitas publicamente por Paulo de Tarso Venceslau, não pretendia voltar ao tema, pois tudo o que tinha a dizer a respeito está no relatório final daquela comissão. Mas o artigo que o denunciante publicou nesta Folha (27/7) a respeito do trabalho da comissão exige resposta.
Paulo de Tarso Venceslau não distorce nem falseia as conclusões da comissão. Ele simplesmente omite as que não lhe agradam, dando aos leitores um quadro unilateral dos resultados da investigação realizada.
É verdade que a comissão concordou com a suspeita de que a Cpem participe de um esquema de repartição do ICMS que dá lugar a fraudes e, por isso, é lesivo aos cofres públicos.
O que Venceslau deixa de mencionar é que a comissão verificou que isso foi descoberto por duas prefeituras petistas -Diadema e Santo André- cerca de seis meses antes que ele, Venceslau, como secretário da Fazenda de São José dos Campos (janeiro a junho de 1993), tomasse providências no sentido de sustar o pagamento de dívida à Cpem.
O mesmo quadro de irregularidades já tinha sido caracterizado em Diadema e Santo André, que igualmente romperam o contrato com aquela empresa e suspenderam os pagamentos a ela.
Esses fatos desmentem a denúncia de Venceslau de que a Cpem "seria do PT" ou teria ligações espúrias com o partido. Na verdade, pelo que apurou a comissão, o PT foi o único partido cujas prefeituras romperam contratos e denunciaram, inclusive perante os tribunais, o referido esquema.
Também em Minas Gerais, onde funciona esquema análogo de repartição do ICMS, foi Milton Tavares, secretário da Prefeitura de Betim, petista, quem fez a denúncia pública do mesmo. Dela resultou CPI, que confirmou inclusive as suspeitas de conluio entre uma firma revisora de demonstrativos e funcionários da Secretaria da Fazenda.
Em momento algum os secretários petistas de municipalidades foram obstados ou pressionados para não agir como agiram contra a Cpem e outras empresas. Foi o que a comissão apurou ouvindo os referidos secretários.
O único secretário que se considerou pressionado foi Venceslau, mas ele mesmo contou à comissão que teve apoio da prefeita e dos demais membros da administração petista de São José em sua ação contra a Cpem.
As suspeitas de Venceslau de que sua demissão teria sido motivada por ter se oposto àquela empresa não foram corroboradas por nenhum outro depoimento, ouvidas todas as pessoas que o próprio denunciante mencionou.
Outra denúncia de Venceslau não corroborada foi a suposta ligação de Lula com a Cpem por sua amizade com Roberto Teixeira, membro do PT.
Venceslau atacou Lula rudemente pela imprensa, mas tomou o cuidado, ao depor perante a comissão, de declarar que em nenhum momento, nas várias oportunidades em que discutiu com Lula a questão da Cpem, este lhe pediu que fosse condescendente com ela.
Venceslau também atribuiu à influência de Lula o fato de suas denúncias, reiteradas ao longo de quatro anos, só terem sido investigadas agora, após o escândalo na imprensa. Essa ilação tampouco foi corroborada por qualquer dos depoimentos obtidos.
A comissão está convicta de que Roberto Teixeira apresentou e recomendou a Cpem a prefeituras petistas e depois, quando tomou conhecimento das irregularidades perpetradas, não alertou o partido nem as prefeituras. Por isso ela recomendou "à Direção Nacional do PT determine de imediato a instauração de processo ético-disciplinar contra Roberto Teixeira".
A mesma recomendação foi feita em relação a Paulo de Tarso, por razões diferentes: "Diante da omissão da direção do partido em apurar suas denúncias originais, veio a fazer publicamente algumas afirmações, sem quaisquer provas e ainda sem indicar os meios pelos quais poderiam ser obtidas... Com essa atitude, o denunciante veio a colocar dirigentes e militantes do PT em uma situação no mínimo constrangedora diante da opinião pública...".
Finalmente, quanto à omissão dos dirigentes do partido, a comissão concluiu que ela foi coletiva, não podendo ser responsabilizado nenhum deles individualmente. A verdade é que não houve omissão, mas demora. Denúncias mais graves e mais bem fundamentadas contra lideranças de outros partidos jamais são investigadas por estes.
O PT demorou em apurar porque: 1) por um erro de julgamento, negou credibilidade às acusações contra seus dirigentes; 2) falta-lhe um órgão com atribuição e competência para apurar acusações contra seus membros. Por isso, a comissão recomendou a instituição de uma ouvidoria no PT, para que esse tipo de erro não se repita.
A Executiva Nacional acatou praticamente todas as recomendações da comissão. Acho que o PT e Lula saem engrandecidos do episódio. Paulo de Tarso tem todo o direito de se sentir reconfortado, mas não de continuar reiterando suspeitas e acusações sem qualquer comprovação.

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