São Paulo, sábado, 23 de agosto de 1997
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Poeta mira objetividade contemporânea

MARILENE FELINTO
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A Editora Nova Fronteira aproveita a ocasião de mais uma bienal do livro no Rio de Janeiro (até o próximo dia 24) para lançar caprichada edição, em dois volumes, de toda a obra poética de João Cabral de Melo Neto.
É outra celebrada reunião da poesia completa, até agora, da obra-cana de João Cabral. Obra-cana: cortante na folha -que tem, "entre as folhas, navalha"-, dura, mas doce como não se previa de longe. E obra-recife: de pedra, de faca só lâmina, mas da engenharia da água que bate, rio mole, e vai esculpindo a língua. Poesia da forma, da geometria da linguagem.
Os dois volumes têm prefácio da mulher do poeta, a também poeta Marly de Oliveira, que vai logo pedindo para ele o Nobel de Literatura, que vai logo revelando uma ou outra intimidade biográfica da poesia cabralina. Sobre "Uma Faca Só Lâmina", Marly de Oliveira diz: "poema complexo, denso, que gira em torno de uma obsessão, a que me reservo o direito de qualificar de amorosa". Por sugestão do próprio poeta, a edição divide sua obra em dois momentos: o primeiro volume, "Serial e Antes", abrange toda a poesia publicada até 1961, incluindo 12 livros, sendo "Serial" o último. "A Educação pela Pedra e Depois" reúne toda a poesia publicada a partir de então, num total de dez livros.
Esses dois momentos compreendem décadas de produção do maior poeta surgido na chamada geração de 45, cuja poesia segue uma linha de evolução que vai das experiências surrealistas de "A Pedra do Sono", à la Drummond de Andrade, passa pelo momento auto-reflexivo ou metalinguístico de "Psicologia da Composição" e se volta para o tom participante ou social de "Morte e Vida Severina", o auto de Natal pernambucano.
Sempre mantendo seus traços característicos, o rigor formal e semântico, a opção pela imagem que conduza do anverso às próprias coisas, a temática que recupera a natureza e a gente de seu Pernambuco ou de sua Espanha, a poesia "antilírica" ou anti-sentimental de João Cabral segue sozinha -é a melhor em língua portuguesa de poeta vivo-, no rumo da objetividade buscada pela poesia contemporânea.

Livros: Serial e Antes; A Educação pela Pedra e Depois
Lançamento: Nova Fronteira
Quanto: R$ 23 (326 págs.), cada volume

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