São Paulo, domingo, 24 de agosto de 1997
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Hospital Jabaquara grava em vídeo depoimentos

PACIENTE DO JABAQUARA
DA REPORTAGEM LOCAL

Os depoimentos abaixo fazem parte de um vídeo realizado em 1994 sobre o programa de aborto legal do Hospital Jabaquara, em São Paulo, o primeiro instalado no país.
São testemunhos de especialistas, membros de movimentos de mulheres e vítimas de estupro que tiveram sua gravidez interrompida nesse hospital.
O vídeo foi criado pela organização não-governamental Ecos (Estudos e Comunicação em Sexualidade e Reprodução Humana).
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Renascimento - "Ele não só me assaltou como violentou. Eu nunca me senti grávida. A gravidez é a coisa mais linda do mundo, mas quando é uma gravidez feita com amor, carinho, não com violência e um revólver te ameaçando. Hoje eu falo abertamente. Tenho menos de dois anos de idade, porque quando cheguei no Jabaquara, eu cheguei morta."

Defesa da vida - "O argumento fundamental levantado pela igreja oficial, aqueles que são contrários à prática do aborto, é a afirmação da defesa da vida. E é esse o argumento que se mantém até hoje. E a realidade que nós temos é de um número enorme de mulheres que morreram por conta da clandestinidade do aborto."
(Maria José Rosado, do movimento Católicas pelo Direito de Decidir)

Rubéola - "Eu fiz aborto em clínica clandestina, mas fui muito bem tratada, bem assistida e saí de lá perfeitamente normal. Fui estuprada. Na primeira vez, eu ia fazer aborto porque tive rubéola quando estava esperando minha filha, com dois meses de gravidez. A minha família não permitiu, hoje ela é deficiente auditiva. Agora, com 35 anos, eu quero ter um nenê. Acho que tudo deve ser planejado. É melhor e muito bem-vindo."

Livre arbítrio - "O que a gente tem que lembrar é que o aborto é um fenômeno social que existe desde que o mundo é mundo, desde que a humanidade existe. Nem o Estado, nem as igrejas, nem a medicina têm o direito de interferir nessa possibilidade que as mulheres têm de decidir sobre sua vida reprodutiva."
(Margareth Arilha, secretária-executiva da Comissão de Cidadania e Reprodução e membro do Conselho Nacional de Saúde)

Alento - "Cheguei aqui, conversei com a psicóloga e ela me explicou, conversou e me levou até o médico. Nessa fase, eles me apoiaram muito, me atenderam muito bem, porque eles viram que eu estava...entrei em parafusos, porque quando a gravidez se confirmou, eu fiquei desorientada."

Desaprendizado - "Eu, pessoalmente, não gosto de interromper nenhuma gravidez, é contra tudo o que a gente aprendeu, tudo o que a gente estudou, todas as nossas experiências. A gente se torna obstetra pela beleza de ver nascer uma criança."
(Aníbal Faundes, médico do Caism, Centro de Assistência Integral à Saúde da Mulher)

Doação - "Nós chegamos aqui, já era tarde demais, não tinha mais condições de fazer (o aborto) porque já estava com 18 semanas. Por isso estamos fazendo aqui. A Márcia veio para ganhar o nenê. Ela já fez 13 anos, só que quando mexeram nela, estava com 12. Ela foi estuprada pelo padrasto. Ela é assim, ela não pôs na cabeça que está esperando um nenê. Ela acha que vai fazer uma operação, porque não quer nem pensar nesse nenê. Vamos doar."
(mãe de paciente do Jabaquara)

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