São Paulo, domingo, 24 de agosto de 1997
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Chang pede que Kuerten 'apague' França

JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO
DE NOVA YORK

Por experiência própria, Michael Chang, 25, prevê sérias dificuldades para Gustavo Kuerten, 20, nos próximos anos.
Assim como o brasileiro, Chang, o atual número dois no ranking da ATP (Associação dos Tenistas Profissionais), tornou-se mundialmente conhecido após vencer o torneio de Roland Garros, na França, em 89.
"Hoje, voltando no tempo, vejo que eu era uma criança (tinha 17 anos) e, por mais que quisesse, não soube lidar com a vitória", disse à Folha o norte-americano. "Depois de ter alcançado a vitória na França, sinto que me deixei levar pela pressão."
Após Roland Garros, Chang viveu uma sucessão de fracassos no Grand Slam, que inclui as quatro principais competições do tênis, os Abertos da Austrália, França e Estados Unidos, além de Wimbledon. "Em 90 e 91, acabei ficando fora dos 'top ten' (lista dos dez melhores tenistas do mundo), porque achava que tinha de ganhar algum torneio do Grand Slam. Afinal, é com eles que as pessoas se preocupam."
Com Kuerten, Chang acha provável acontecer a mesma coisa. "Antes de Roland Garros, ninguém dava atenção a ele. Agora, tudo mudou."
"Ele nunca tinha disputado o Aberto dos Estados Unidos e já entra como cabeça-de-chave. Em maio, se fosse eliminado na primeira rodada, ninguém ligaria. Em agosto, se acontecer a mesma coisa, as pessoas não perdoarão."
"E sabe qual o problema? Se perder de cara, ele próprio não vai se perdoar. Foi assim comigo."
Se tivesse de dar algum conselho a Kuerten, Chang diria para ele "apagar" Roland Garros.
"O segredo está em exigir de si mesmo apenas o que estiver a seu alcance", acha o norte-americano.
"Das minhas decepções pós-Roland Garros, eu aprendi muito. Você não pode render mais do que sua capacidade. Hoje, quando saio derrotado da quadra, saio absolutamente sereno se sei que dei o máximo de mim. É só o que importa."
Conto de fadas
Para Chang, assim como acha que será para Kuerten no futuro, a conquista de Roland Garros parece que não existiu.
"Sabe quando um velhinho vai contar uma história para os netinhos dormirem? No final a gente se pergunta se isto realmente aconteceu ou é um conto de fadas. É assim com Roland Garros."
Hoje, qualquer outra conquista para Chang não teria o mesmo sabor da que obteve aos 17 anos.
"Quando você é criança, o sonho é importante. No porão de casa, quantas vezes não venci na minha cabeça um McEnroe, um Connors, um Borg, aquelas figuras maravilhosas?", perguntou.
"De repente, o sonho aconteceu, e você não acredita. E daí começam a tratá-lo como um ídolo, você acredita, passa a exigir de si mesmo o que esperava e exigia de um Borg, e o sonho acaba."
Dedicação
A volta por cima, segundo o número dois do mundo, só acontece quando o sujeito valoriza as pequenas coisas.
"Eu me dedico a qualquer torneio da mesma forma. Se uma pessoa estiver na platéia, eu vou me esforçar tanto quanto faria se forem 23 mil, como será no Aberto."
"Ganhando os pequenos torneios, fui pontuando, pontuando e sou o segundo do ranking. Não tenho carisma? Não sou um gênio? Não me preocupo com o que dizem ou com aquilo que querem que eu seja. Sou o que sou e estou feliz assim."
Jogo da paciência
Eliminado do torneio de Long Island nas quartas-de-final, após perder para o australiano Patrick Rafter por 2 a 1, parciais de 6/4, 3/6 e 6/1, Chang seguiria ontem para Nova York para se concentrar para o Aberto, que começa amanhã.
No ano passado, perdeu a final para Pete Sampras, número um do mundo. Em 97, acha que ganha quem tiver mais paciência.
"Não adiante querer inovar. Vou jogar no meu estilo, com calma, sem afobação. Se der resultado, ótimo. Se não, era o que eu poderia ter feito de melhor. Volto para casa e durmo tranquilo."

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