São Paulo, domingo, 24 de agosto de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Receita de mudança

JUCA KFOURI

O pernambucano Everardo Maciel é um dos melhores quadros do governo FHC.
Secretário da Receita Federal, discreto, bem formado e de fala macia, leva tão a sério o sigilo que necessariamente deve cercar o seu ofício que criou para efeito interno uma figura deliciosa: o cidadão sonegador.
Isso mesmo. Maciel, abnegado torcedor do Sport, defende até a morte o direito que até os sonegadores têm de ser tratados como cidadãos. E tem razão. O que não significa nenhuma forma de impunidade, ao contrário.
Os elogios abundantes aqui contidos são também para revelar uma queixa: Maciel é uma péssima fonte de informações, embora seja ótima conversa quando o assunto fica restrito aos temas puramente conceituais.
Dito isso, cumpre ainda dizer que ele está desempenhando um papel relevantíssimo na modernização do futebol brasileiro, apesar de jogar, digamos assim, recuado, mais para Dunga que para Ronaldinho.
Pois a devassa fiscal a que está submetendo o submundo do nosso futebol pode ser o caminho da transparência e, até, do afastamento daqueles que, como disse com razão o vice-presidente do Barcelona, gostam de ganhar dinheiro fácil, sem esforço.
Multas pesadas já têm sido aplicadas, obrigando pelo menos um cartola a se desfazer de parte da riqueza ilicitamente acumulada para saldar suas dívidas com a União. E vem mais.
Sintomática, por exemplo, foi a declaração do jogador da Lusa, Rodrigo, quando lhe perguntaram o que irá fazer com o dinheiro de sua negociação com o Real Madrid. "Primeiro, pagar o Imposto do Renda, porque os homens estão atentos, e, depois, comprar um imóvel."
É claro que a Receita sabe que os atletas são o elo mais frágil na corrente da sonegação, até porque frequentemente compelidos a aceitar os esquemas de caixa dois e pagamentos por fora.
Mas é por intermédio deles que a sonegação mais grossa irá aparecer, reveladora dos paraísos fiscais do Uruguai às Bahamas e da lavagem de dinheiro, muito dinheiro.
Resta esperar que Maciel não tenha o mesmo fim de seu antecessor, Osíres Lopes Filho, que caiu no governo Itamar Franco por conta do episódio do vôo da muamba.
Afinal, os torcedores, cidadãos contribuintes, estão adorando assistir a esse jogo.
Já não era sem tempo.

Texto Anterior: Grand Slam; Match Point; Dupla falta
Próximo Texto: Tabela móvel do Brasileiro dribla a Loteria Esportiva
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.