São Paulo, terça-feira, 26 de agosto de 1997
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Ousar pensar, ousar vencer

EDUARDO JORGE

Em 6/8 foi lançado no Rio de Janeiro o livro "Vale a Pena Sonhar", do revolucionário Apolonio de Carvalho: 85 anos de idade e 65 anos de militância socialista. Lutou na Guerra Civil Espanhola e na Resistência francesa. Ex-dirigente do PCB e do PCBR. Um dos fundadores-símbolo do PT. Vejamos trechos de recente entrevista sua:
"O PT, o maior partido de esquerda, apresenta a continuidade de certos erros. Não apresentamos alternativas para as distorções do Plano Real, para a modificação da imagem do Estado. Falta-nos, na esquerda, uma política de alianças, sem o que, a história já provou -não só no Brasil-, não é possível dividir as forças dominantes. Um programa comum de centro-esquerda uniria as diversas posições da esquerda em torno de elementos fundamentais."
"Se houver a unidade de centro-esquerda com um programa abrangente, capaz de ganhar faixas dos outros partidos, não obrigatoriamente esse candidato teria de ser do PT, mas um nome que reunisse condições políticas e culturais e tivesse projeção nacional."
"Alianças com base em um programa, não fechadas em gabinetes, mas trazidas e decididas com os eleitores, podem atrair qualquer partido. Essas alianças são transitórias, mantidas apenas para viabilizar pontos de programa. Em eleições estaduais e municipais, é possível incluir o PSDB. Para presidente é delicado. Seria mais plausível, nesse caso, uma aliança com setores do PSDB".
É escudado em sua autoridade que sugiro o seguinte caminho para a oposição no Brasil:
1) há chance de derrotar FHC/PFL, se unificarmos a esquerda e os setores mais amplos possíveis do centro democrático. Ou nós vamos ficar rezando por uma hipotética catástrofe financeira internacional para colher nas nossas mãos os escombros do país? Ou vamos ficar "marcando passo", com os nossos 30% de votos em Lula? Ou vamos inventar outro candidato petista, para "fazer um novo nome" para 2002?
Não. A meu ver, devemos buscar uma tática com alguma chance de derrotar o atual bloco no governo, e isso não é impossível, embora difícil.
Unificar a esquerda, buscar setores de centro e escolher um candidato unitário do campo centro democrático, tipo Requião, Sepúlveda Pertence, Ciro Gomes, Célio de Castro, Cristovam Buarque, Waldyr Pires, Itamar Franco etc., é uma tarefa indelegável do PT, o maior partido da esquerda brasileira. Em torno desse nome constroem-se uma frente e um programa capazes de empolgar e dar segurança ao povo brasileiro, com apoios institucionais e populares suficientes para governar eficiente e democraticamente;
2) o foco do crescimento institucional prioritário da esquerda é o Parlamento. Os governos estaduais estão enfraquecidos. Reféns do governo federal. De certa forma, podemos acumular até mais, quando à frente de prefeituras, onde a liberdade de movimentos e o contacto popular são maiores.
Qual o espaço institucional, nos próximos cinco anos, onde poderemos exercer influência mais incisiva e eficiente? É o Parlamento. Por exemplo, o PT tem 50 deputados, e toda a esquerda, 98, num universo de 513 deputados. Se concentrarmos as forças no reconhecimento popular de nossa marcante atuação parlamentar, poderemos, sem dúvida, dobrar esses números.
O PT teria 80, e a esquerda, 160. Nesse patamar, poderemos atrair cerca de 50 do chamado centro, aglutinando mais de 200 deputados. Com esses números, nada se decidirá em Brasília sem passar por nossa opinião;
3) como esse caminho se desdobra em cada Estado da Federação?
São Paulo: lançar uma superchapa de esquerda para deputados federais, encabeçada por Lula e Erundina. Oferecer um apoio crítico ao governador Mário Covas, investindo nas diferenças sutis, mas significativas, entre ele e FHC e bloquear o crescimento da extrema direita de Paulo Maluf. Garantir o apoio do governo estadual ao senador Suplicy. Independência para apoiar nosso candidato a presidente.
Rio de Janeiro: chapa para deputados federais encabeçada por Brizola. Disputar o governo com um candidato do PDT (Garotinho ou Roberto Silveira).
Minas: chapa de deputados comandada por Patrus Ananias. Apoiar a reeleição da senadora do PDT e um governador do campo do PMDB, ligado a Zaire Rezende ou Itamar Franco.
Rio Grande do Sul: Olívio e Tarso. Um é candidato a governador, o outro puxa a chapa de deputados. Apoiar a reeleição do senador Pedro Simon, do PMDB.
Bahia: frente total anti-ACM. Waldyr Pires puxa a chapa de deputados.
Pernambuco: apoiar o PSB e Arraes na reeleição.
Outros Estados: lançar candidatos próprios ao governo ou apoiar outro nome do centro democrático, que permita acumulação para nosso campo.
Todo esse movimento exige da oposição um amadurecimento e uma forte autoconfiança em seu projeto e em sua identidade partidária. É necessário que os dirigentes, os parlamentares, os militantes se convençam disso. Da parte do povo, do trabalhador não-filiado, do eleitor, tenho certeza de que esse caminho será entendido e abraçado com entusiasmo.
A esquerda estará já, na prática, no centro das decisões nacionais e preparando-se para tarefas mais importantes em 2000 e 2002.

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