São Paulo, sexta-feira, 29 de agosto de 1997
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Retrato íntimo de Woody Allen é exibido

AMIR LABAKI
DO ENVIADO ESPECIAL A VENEZA

Mesmo à distância, rodando em Nova York seu novo filme, Woody Allen domina Veneza-97. "Deconstructing Harry", exibido anteontem na sessão de abertura, estabeleceu um patamar que dificilmente outro filme alcançará. Ontem foi a vez da cena ser roubada por "Wild Man Blues", o documentário dedicado a ele por Barbara Kopple, premiada por duas vezes com o Oscar da categoria.
Kopple acompanhou cada minuto da turnê européia realizada no início de 97 por Allen à frente de sua banda de jazz estilo New Orleans. Jamais antes o diretor de "Manhattan" oferecera tão generosamente sua intimidade às câmeras. "Wild Man Blues" parece uma estudada resposta à invasão da privacidade de Allen a partir da escandalosa separação de Mia Farrow. Pela primeira vez ele deixa-se filmar relaxadamente ao lado de Soon-Yi Previn, filha adotiva de Mia que virou sua companheira.
Soon-Yi soube aproveitar a oportunidade. Só se separa de Allen quando este sobe ao palco para tocar clarinete. Aconselha-o a explorar o humor no espetáculo musical. Critica "Interiores", o primeiro Allen à moda Bergman. Força-o a nadar numa piscina. Por certo, de publicidade ela entende.
Durante quase duas horas o filme acompanha cronologicamente a viagem do grupo, começando em Paris e terminando em Londres, com escalas em Madri, Viena, Veneza, novamente Paris, Bolonha, Turim e Roma. A câmera flagra o casal Allen dentro do avião particular e de cada suíte de hotel.
O Woody real parece menos neurótico do que o Woody das ficções. O delicioso criador de frases sucumbe apenas uma vez à depressão. A exposição pública supera muito a que parecia suportável pelo diretor de "Memórias".
Depoimentos valiosos são registrados por Kopple. "Paris é a única cidade, fora Nova York, em que poderia viver", reconhece Allen. Dizendo sofrer de "insatisfação crônica", complementa resignado: "Quando estou em Nova York queria estar na Europa. Na Europa, sinto falta de Nova York...".
O filme não deixa dúvidas sobre sua genuína paixão por música. "Ensaio clarinete todos os dias", assume. "Tocar jazz é como tomar banho de mel", esbalda-se. "Cresci ouvindo Billie Holliday, Louis Armstrong, o melhor da música popular deste século".
"Wild Man Blues" tem um fecho de ouro. Na volta a Nova York, registra uma visita de Allen e Soon-Yi aos pais do cineasta. A jovem tem de ouvir a sogra criticar a relação do filho com uma "chinesa" e defender o namoro com "uma boa garota judia".
Mas a típica supermãe não contém um elogio: "Ele tem muito talento para contar uma história". Para fazer justiça, faltou dizer: Barbara Kopple também.
(AL)

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