São Paulo, sábado, 30 de agosto de 1997
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Plano privado não é SUS

PINHEIRO LANDIM

A discussão em torno da lei que irá regulamentar o funcionamento dos planos privados de saúde trouxe à tona todas as mazelas do sistema de saúde pública no Brasil.
Como o Estado não oferece um atendimento decente aos seus contribuintes, estes buscam as operadoras, que dispõem de várias opções de assistência e seguros. Esse mercado agigantou-se, reunindo hoje em torno de 43 milhões de consumidores.
O que se procura, agora, é regulamentar a atividade, estabelecer regras que protejam os direitos dos usuários e possibilitem melhores condições de atendimento.
Qualquer ramo de atividade, no entanto, opera com um componente chamado "custo", e a garantia de sua sobrevivência está, justamente, na relação entre despesa e receita.
O governo, por exemplo, sabe muito bem o que representou o desequilíbrio dessa relação nas contas da saúde pública: a falência do sistema a curto prazo. Por que seria diferente com os planos privados?
Nada, portanto, é mais demagógico do que promover a falsa idéia de que os planos poderiam substituir o Sistema Único de Saúde (SUS). Atender a todo tipo de cobertura é possível, mas forçaria uma adequação de custos, e um segmento expressivo da sociedade certamente não teria acesso aos planos.
É preciso, também, respeito ao direito do consumidor de poder escolher o plano de seguro e de saúde dentro das condições que o atendam plenamente. Nunca é demais recordar que o Brasil não se limita aos grandes centros urbanos.
Na grande maioria das cidades do interior, presta-se assistência médica de qualidade, estimulando uma demanda de usuários que estão dispostos a pagar por seus próprios planos, dentro, é claro, das limitações de atendimento impostas pelos recursos de saúde disponíveis nessas localidades.
Toda essa discussão seria desnecessária, como bem observou esta Folha (25/8, editorial "Sem Saúde"), se o Estado, cumprindo com as suas obrigações, oferecesse serviços de saúde em condições satisfatórias.
Os cidadãos, com certeza, sairiam fortalecidos nas negociações com as operadoras, e a medicina privada seria um assunto restrito a um segmento da sociedade disposto a pagar por mais conforto e facilidades.
Quem impôs ao cidadão brasileiro um sistema público sofrível de atendimento à saúde, desarticulado, descontrolado e a cada dia mais inviável, que castiga grandemente a população mais carente, não pode e não deve querer patrocinar regras e procedimentos para sistema alternativo. As experiências vitoriosas é que devem ser imitadas.
Igualmente, discurso não gera saúde. Basta de utopias pretensamente generosas, mas divorciadas da realidade. O cidadão que contribui adicionalmente tem o direito inalienável de escolher o serviço de saúde que preencha suas necessidades e atenda sua capacidade contributiva, sem a ajuda dos "conselheiros" de ocasião.
O projeto de regulamentação tem dois objetivos bastante visíveis: estabelecer normas rigorosas para as operadoras de planos e seguros privados de saúde, obrigando-as a crescente qualidade de serviços e ao estabelecimento de preços adequados; e, principalmente, assegurar os direitos devidos aos usuários, especialmente os recém-nascidos e idosos.
E, como a melhor forma de defender os interesses do consumidor é zelar pela concorrência, o projeto estimula a competitividade no setor, permitindo inclusive o ingresso de capital externo.
Ainda não é o texto definitivo, mas já representa um avanço importante.

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