São Paulo, quinta-feira, 18 de setembro de 1997
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Um escândalo revisitado-2

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

Na quinta-feira passada, recebi uma Notificação Judicial Criminal do Banco Central, pedindo explicações sobre artigo publicado nesta coluna em 14 de agosto a respeito do caso do Banco Nacional, sob o título "Um escândalo revisitado""
A passagem do artigo considerada injuriosa é a seguinte: "As deficiências do sistema de fiscalização do Banco Central são conhecidas. Mas é pouco plausível que uma fraude dessa dimensão, que persistiu por tanto tempo, tenha passado inteiramente despercebida do Banco Central. Fica a forte suspeita de que o Banco Central, nesse como em outros casos, cedeu e omitiu-se em face do poder político de interesses financeiros privados." Segundo a notificação, essas afirmações "caracterizam os crimes de difamação e injúria".
O Banco Central pede a apresentação dos nomes das autoridades ou servidores responsáveis. Sustenta que há "dubiedade" no artigo e que a interpelação judicial é necessária para "preservar a sua imagem e reputação, até mesmo punindo os servidores que eventualmente tenham praticado ações ou omissões que caracterizam crime".
É louvável a preocupação do Banco Central em descobrir as autoridades ou servidores responsáveis, mas não sabe a mim identificá-los.
Não há dubiedade no artigo incriminado. O trecho considerado ofensivo não pode ser isolado do seu contexto. Alguns dias antes da publicação do artigo, veio a público que a Polícia Federal concluíra inquérito instaurado para apurar os fatos que determinaram a intervenção no Banco Nacional. Os resultados da apuração policial, citados no artigo, são impressionantes: 1.046 contas fraudulentas, um passivo a descoberto de R$ 9,2 bilhões e uma receita fictícia de R$ 16,9 bilhões entre 1988 e 1995.
A propósito das afirmações oficiais de que as fraudes no Nacional só foram percebidas depois da intervenção em fins de 1995, lembrei a entrevista do advogado da família Magalhães Pinto, Sérgio Bermurdes, dando conta de que "na primeira semana de Loyola no BC, a direção do Nacional o colocou a par de toda a situação do banco em seus pormenores". Pelo que me consta, essa declaração nunca foi desmentida.
Por que o Banco Central demorou tanto a agir? Se agisse antes, a extensão dos prejuízos para os cofres públicos seria a mesma? O Banco Central não dispõe de mecanismos de controle capazes de detectar fraudes dessa magnitude, praticadas durante período tão longo? O Banco Central instaurou algum procedimento interno para apurar se houve ou não a omissão de autoridades e servidores? O governo federal se opôs à tomada de qualquer atitude anterior do Banco Central, assim como se opôs à abertura de uma CPI no Congresso?
A explicação "errar faz parte da atividade humana", do ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola citada no artigo incriminado, é suficiente para encerrar as discussões em torno do episódio ou revelam, ao contrário, a necessidade de um amplo debate em torno da reforma do Banco Central?
No caso do Banco Nacional, dúvidas e suspeitas de omissão são perfeitamente legítimas. Quem deve explicações não sou eu, mas o próprio Banco Central.
Não acusei este ou aquele servidor em particular e não tenho nomes a apresentar. O que prejudica a imagem e reputação do Banco Central é a falta de esclarecimentos e de transparência. Em benefício da própria credibilidade do Banco Central e para que "erros" não voltem a ser cometidos, o episódio do Banco Nacional deveria ser discutido de forma aberta.
O Banco Central é uma instituição pública e como tal, num ambiente democrático, deveria se acostumar à liberdade de imprensa e ao direito de crítica.

E-mail pnbjr@ibm.net

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