São Paulo, quinta-feira, 18 de setembro de 1997
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Ney mergulha no 'erudito' de Villa e Tom

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

"O Cair da Tarde", novo disco de Ney Matogrosso, 56, aprofunda o namoro que o artista vem promovendo entre o popular e o erudito em música brasileira.
Como numa gradação, Ney vem de cantar Angela Maria ("Estava Escrito", 94) e Chico Buarque ("Um Brasileiro", 96) e chega agora a Antonio Carlos Jobim e Heitor Villa-Lobos.
"Não é uma gradação, mas um mergulho de volta ao nosso passado musical, que culmina com Villa-Lobos. Coloquei-o ao lado de Tom Jobim porque ele sempre declarou o quanto foi influenciado por Villa", explica Ney.
Em quase metade do disco -em geral nas canções de Villa-Lobos-, Ney se faz acompanhar pelo conjunto instrumental mineiro Uakti. Funde assim dois projetos -o de gravar um CD com temas de Villa-Lobos e o de gravar um CD com o Uakti.
Ney diz que a aproximação entre presente e passado, popular e erudito é mais antiga. "Desde 'O Pescador de Pérolas' (85), já acontece essa mistura. Antes disso, meu trabalho era pop. Depois, quis fazer um trabalho mais significativo dentro da música brasileira."
Ele diz que quer desmistificar, no entanto, o valor "erudito" puro de Villa-Lobos. "Acham que Villa é sinfônico apenas, mas ele foi o que havia de mais popular. É um repertório pseudo-erudito."
A pesquisa sobre o compositor Ney implementou no museu Villa-Lobos, onde buscou letras e partituras.
Não se interessou pela história por trás das canções, de como elas receberam letras de nomes como Manuel Bandeira, Hermínio Bello de Carvalho e Dora Vasconcellos (amiga íntima de Villa-Lobos). "Não achei necessário", diz.
Ney afirma saber do processo de vulgarização -pelo excesso de gravações- por que passa a obra de Tom Jobim desde sua morte. "Sei disso, mas procurei reproduzir o Tom mais parecido com Villa, e por isso menos conhecido."
Ele define o resultado: "É um dos meus discos mais bem realizados, estou cantando bem. Eu era exagerado, excessivo, agora estou maduro". Discorda que tal transformação venha do aprimoramento técnico. "A técnica não me preocupa. O mais importante é o sentimento."
O desinteresse pelo pop mantém adormecido o Ney escandaloso que surgiu com os Secos & Molhados, em 73, e manteve-se nos primeiros anos de carreira solo, a partir de 75.
"O performer naqueles termos de antes não tem mais sentido. Hoje não pretendo chocar ou desafiar o governo, a sociedade hipócrita, como antes. Hoje tudo é permitido, ninguém se choca mais."
No futuro próximo, pretende interromper a série de regravações. "Já estou selecionando repertório de músicas pop inéditas, de compositores desconhecidos."

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