São Paulo, sábado, 20 de setembro de 1997
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A maquiagem paraguaia

SYNÉSIO BATISTA DA COSTA

Não tem sido fácil a vida para quem estava acostumado a contrabandear mercadorias do Paraguai para o Brasil. Nos últimos anos, as autoridades da Polícia Federal e da Receita conseguiram reduzir significativamente o contrabando.
No entanto, uma porta continuava aberta para que produtos vetados pelo Brasil e pelo Primeiro Mundo continuassem ingressando em nosso país via Paraguai. Por meio das "importações" dos sacoleiros, o Brasil seguia infestado desses produtos, fabricados sobretudo na Ásia, com dumping, fora de normas técnicas, provocando riscos ao consumidor e sem nenhuma garantia.
Essa porta se estreitou quando o governo brasileiro reduziu de US$ 500 para US$ 150 a cota máxima individual permitida para compras de brasileiros nas cidades paraguaias de fronteira.
Tudo isso somado prejudicou não somente contrabandistas e sacoleiros, mas também os comerciantes paraguaios que se beneficiavam da situação anterior, localizados sobretudo na fronteira com os dois maiores mercados consumidores da América do Sul: Brasil e Argentina.
A reação era esperada. No entanto, o que causou surpresa foi o fato de o governo do Paraguai haver embarcado nesse lobby, ao aprovar em julho a Lei da Maquiagem, que cria o Programa de Maquiagem de Exportação.
Por esse programa, todas as pessoas físicas e jurídicas estabelecidas no Paraguai poderão importar produtos, máquinas e equipamentos destinados à reexportação, pagando apenas 1% de imposto único. Se o produto maquiado tiver 50% de componentes nacionais, poderá ser vendido no Mercosul como se fosse feito no Paraguai, beneficiando-se da tarifa reduzida.
Ou seja, o comerciante paraguaio de Punta Del Este poderá importar um brinquedo feito por presos na China por um centavo de dólar, envolvê-lo numa embalagem paraguaia que custa mais um centavo e exportá-lo legalmente para o Brasil, a Argentina e o Uruguai, sem limite de quantidade, com alíquota de Imposto de Importação reduzida.
Evidentemente, a flagrante concorrência desleal à indústria brasileira e argentina suscitou reclamações formais dos governos dos dois países. O Paraguai só escapou de ser excluído do Mercosul porque o Uruguai, que não tem desenvolvidas indústrias eletrônicas e de brinquedos, não se sentiu prejudicado. Agora, o caso será levado ao mecanismo de solução de controvérsias do Mercosul.
Espera-se que o governo paraguaio visualize o prejuízo que provocará ao Mercosul e ao seu próprio desenvolvimento se insistir em oficializar um mecanismo de desencalhe do contrabando. Não se pode, em defesa de meia dúzia de comerciantes de fronteira e dos atacadistas do contrabando, colocar em risco a formação de um bloco econômico da importância do Mercosul.

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