São Paulo, segunda-feira, 28 de dezembro de 1998
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Cortes perversos

MAGNO DE AGUIAR MARANHÃO

O governo federal comete um ato abominável contra a maioria da população ao estabelecer cortes na já por demais sacrificada área social no revisto Orçamento de 99.
Em relação à proposta anterior de Orçamento, de agosto, os recursos da saúde caem 6,6% e os da educação sofrem redução proporcionalmente bem maior: 12,3%, representando R$ 572 milhões de um total de R$ 4,5 bilhões.
Esses dois setores deveriam liderar a lista das prioridades nacionais; no entanto, estão sucateados, assim como os demais serviços públicos. Por isso mesmo, o governo prometeu preservá-los quando começou a falar na necessidade do ajuste fiscal.
A promessa, entretanto, está sendo descumprida, a não ser que se admita a existência de gordura. Mas, nesse caso, poder-se-ia perguntar por que ela foi mantida até agora, em um quadro de dificuldades iniciado há bastante tempo.
Sabemos a quantas anda a saúde, grande fonte de manchetes -sempre negativas- dos jornais. Para ampará-la, criou-se a CPMF, que, provisória, está quase virando definitiva. Mas os recursos foram dados pelo governo com uma mão e tirados com a outra, permanecendo tudo como estava.
Tirar ainda mais desse bolo é condenar à morte milhares de brasileiros, principalmente os aposentados, desempregados e subempregados.
A educação, que deveria ser o alicerce do país, enfrenta carência de recursos similar à da saúde, situação mais grave no momento em que precisa corrigir deficiências e aparelhar-se para enfrentar os desafios do próximo milênio, entre os quais as crescentes exigências do mercado de trabalho.
A essa altura, até programas essenciais correm perigo, como o Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental).
O Fundef foi muito festejado por possibilitar o resgate da dignidade dos professores, já que 60% dos seus recursos têm de ser destinados à folha salarial do magistério. Em algumas cidades, o fundo já operou milagres, apesar do pouco tempo de existência.
Antes de a crise ganhar contornos mais graves, o governo já havia anunciado que iria contrariar a lei, deixando de reajustar seu repasse para o fundo no ano que vem. Neste ano, o gasto mínimo aluno/ano foi de R$ 315, tendo de saltar para algo em torno de R$ 430 em 99. Isso é o que determina a lei, mas em agosto o governo já dizia que só poderia dispor, no máximo, de R$ 340.
Pois agora, com os novos cortes impostos pela equipe econômica, nem esse pequeno aumento será possível. E não será surpresa se ocorrer até uma redução dos já parcos recursos.
Ninguém sabe, por exemplo, como um reduzidíssimo grupo de técnicos, sem ouvir ninguém, chegou aos índices de cortes propostos. Além disso, a sociedade não foi suficientemente informada sobre os setores a serem afetados e em que profundidade.
Retroceder no programa de valorização do magistério, abandonar o projeto de ensino à distância, reduzir o programa do livro didático e cortar verbas dos hospitais universitários, que prestam enormes serviços ao ensino e à população carente, é uma agressão covarde ao povo, algo até há pouco tempo inimaginável.
Falta transparência nessa questão, entregue a um grupo de burocratas que só enxergam números à sua frente e são insensíveis aos problemas dos contribuintes mais carentes.
Esperamos que, independentemente das cores partidárias, os parlamentares estejam conscientes da sua enorme responsabilidade e sejam sensíveis ao clamor público.
Do contrário, teremos um gigantesco retrocesso, de dificílima recuperação. Podemos até ter um equilíbrio das contas digno de aplausos entusiásticos do FMI, mas à custa de um desequilíbrio social jamais visto.

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