São Paulo, segunda-feira, 28 de dezembro de 1998
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A grande prioridade

CARLOS EDUARDO MOREIRA FERREIRA

A próxima legislatura no Congresso Nacional se apresenta como um grande desafio para aqueles que buscam tornar o Brasil governável em bases politicamente mais sólidas e coerentes. É preciso encontrar soluções institucionais que nos distanciem da prática corriqueira das negociações miúdas -ainda persistentes na nossa realidade política de hoje. Temos o dever de adaptar as estruturas do país às exigências necessárias para sua inserção soberana na economia globalizada.
Como partidário do parlamentarismo, ainda que considere difícil aprovarmos a curto prazo emenda constitucional para implantar esse regime de governo, não tenho dúvida de que ao menos uma corajosa reforma político-partidária deve ser feita desde logo.
O voto distrital misto, com a consequente racionalização dos gastos nas campanhas eleitorais, e a exigência de fidelidade partidária, tornando mais solidárias e confiáveis as diversas bancadas no Legislativo e fazendo menos complexo e fragmentário o jogo político, ao lado de mecanismos que evitem a proliferação de agremiações políticas nanicas, são passos fundamentais para a obtenção de uma correlação de forças mais estável no Congresso, bem como para aprimorar a qualidade dos trabalhos legislativos.
É óbvio que o mais desejável (ou o ideal) seria a adoção de um sistema político que propiciasse a garantia de governos da maioria, com pleno respeito pelas minorias, sempre aptas a chegar ao poder quando houvesse descompassos mais graves entre governantes e governados. Nesse sentido, esses aspectos apontados da reforma político-partidária estão no substrato do parlamentarismo, que defendemos como meta a ser alcançada no prazo determinado pelas circunstâncias históricas.
Até lá, porém, se meditarmos acerca da difícil tarefa que recai sobre o presidente da República durante o próximo mandato, para consolidar o que já foi feito, e se atentarmos para as dificuldades que já surgiram ou lhe foram criadas antes mesmo do início do novo período, até por disputas entre os que cogitam sucedê-lo, não parece despropositado que se coloque a questão do regime parlamentarista como prioridade na agenda política do país.
Pode ser esse o caminho que devemos trilhar para consolidar não apenas nossas recentes conquistas no campo da estabilidade monetária e na participação do Brasil como parceiro confiável nas relações comerciais com a comunidade internacional, mas sobretudo para fazer com que se aprimorem nossas instituições democráticas e ocorra o exercício cada vez mais responsável do poder político.
De qualquer modo, acredito indispensáveis e urgentes (não somente para o setor produtivo, mas para toda a sociedade) algumas reformas que ainda estão, infelizmente, por fazer. Entre elas, citaria a do atual e perverso sistema tributário, para desonerarmos a produção, tornando o produto brasileiro mais competitivo nos mercados externo e interno, e para propiciarmos mais equitativa distribuição da riqueza.
Praticamente no mesmo grau de importância está o prosseguimento da reforma da Previdência Social, a fim de possibilitarmos, pela ampla adoção do regime de capitalização, a formação de poupança interna, suscetível de tornar o país menos dependente dos investimentos estrangeiros para o seu desenvolvimento.
São conhecidos os grandes obstáculos para a realização de tais reformas com a profundidade que seria desejável. A primeira, por interferir no pacto federativo e nas receitas das três esferas de governo; a outra, por mexer com interesses estabelecidos e com expectativas de segurança por vezes não mais que ilusórias, que significam benefícios e promessas impossíveis de cumprir, por não guardar relação com a capacidade presente e futura da própria sociedade para sustentá-los.
Mas, quanto mais cogito sobre tudo isso, mais plausível me parece que, mediante a adoção do regime parlamentarista, ainda que não de imediato, tornaríamos menos complicada a discussão daquelas duas reformas e de outras de que o Brasil tanto carece. Pois, com a perspectiva do novo sistema de governo, as forças partidárias e os próprios políticos tenderiam a agregar-se de modo ideologicamente mais coerente, preparando-se para novos e melhores tempos.

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