Diretor residente na Dinamarca fala sobre método em que "desaprender" é tão essencial quanto ganhar conhecimento

Palestra do diretor italiano acontece na quinta no teatro Sérgio Cardoso, com demonstração de técnica vocal da atriz Julia Varley

Dário Gabriel/25.nov.2009

O diretor Eugenio Barba, que criou o Odin Teatret há 46 anos

GUSTAVO FIORATTI
DA REPORTAGEM LOCAL

Um dos maiores desafios de um artista experiente, diz o diretor italiano Eugênio Barba, é saber desaprender.
Maneirismos podem, com certo risco, se incrustar no trabalho de quem extrai da criatividade um projeto de vida. E ele, que completa 46 anos à frente do grupo Odin Teatret, na Dinamarca, discorre em palestra no teatro Sérgio Cardoso justamente sobre os métodos que desenvolveu para criar uma identidade sem vícios.
"É o paradoxo do conhecimento", resume o diretor em entrevista à Folha, por e-mail. "Nós nos esforçamos para aprender e, com o tempo, o que sabemos determina nossa identidade profissional. Mas essa forma comporta maneirismos. Daí a luta contra o saber aprisionado com clichês", diz.
Tão fortes podem ser as mudanças de um processo criativo para o outro que Barba as define com a palavra "terremoto". "O terremoto maior é quando iniciamos um novo espetáculo. Tudo o que havíamos feito antes não pode ser utilizado."
"O Tapete Voador", que será exibido na quinta após a palestra, ilustra alguns desses princípios. Rememora processos utilizados anteriormente para estimular e descobrir possibilidades vocais, consideradas como exercícios "que empenham o organismo do intérprete".

Teatro Pobre
A demonstração do método é da atriz Julia Varley, que trabalha no Odin desde 1976. Todos do grupo, assim como ela, têm espetáculos próprios como esse, espécie de repertório sobre métodos pessoais de trabalho.
A exemplificação implica questões do desgaste íntimo que atinge a todos, diretor e intérpretes, gerando "tensão e desorientação", diz Barba.
Meticuloso, o diretor também procura dar um tratamento às memórias do ator. Antes de entrar para o Odin, Julia Varley trabalhou cinco anos em um grupo de teatro político de Milão, o que, para Barba, pode definir detalhes. "É evidente que seu corpo-memória está profundamente influenciado por seu aprendizado técnico e seu processo de autonomia, suas rebeliões, conquistas e o profundo sentido de responsabilidade", diz.
Por essas artérias de Barba corre a influência do diretor polonês Jerzy Grotowski (1933-1999), antigo parceiro e mestre. Grotowski foi o criado do Teatro Pobre, calcado também na valorização de um trabalho psico-físico do ator.