São Paulo, quinta-feira, 03 de junho de 2010

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CRÍTICA TEATRO

Espetáculo racionaliza o autismo nas falas

Apesar do brilho de atrizes, "A Máquina de Abraçar" decepciona por desfecho óbvio e esvaziamento do drama

LUIZ FERNANDO RAMOS
CRÍTICO DA FOLHA

A ciência e a arte exploram o desconhecido. A primeira precisa da prova enquanto ao artista importa mais o mistério. "A Máquina de Abraçar" hesita entre a racionalidade e a metafísica antes de sucumbir ao senso comum.
O texto, do espanhol José Sanchis Sinisterra, especula sobre o autismo, nome genérico para síndromes variadas que desafiam os neurologistas. Seus portadores têm dificuldades em lidar com outros seres humanos.
Na peça, evoca-se a doença a partir do caso de Temple Grandin, autista lendária, que projetou um artefato capaz de dar-lhe o prazer de um abraço sem a aflição do toque de outra pessoa.
Sinisterra parte dessa referência para criar o eixo da trama. Em um congresso, uma psiquiatra apresenta um caso raro de autismo.
A encenação de Malu Galli converge com a vocação discursiva do autor, propondo pontuações sonoras para gerar uma aura misteriosa nas ações da palestrante.
A partir da aparição da personagem autista, que contracena de forma estranha com a médica e se torna ela própria protagonista da conferência em curso, a peça ondula com alguma graça entre a retórica racional da cientista e a fala poética e desestabilizada da sua cliente.
Contudo, à medida que esse jogo vai findando, e a despeito do brilho das atrizes, Marina Viana e Mariana Lima, as sugestões de transcendência que o drama alimentara se esvaziam. Os ruídos são banalizados e a expectativa de uma aproximação da vida anímica dos autistas se frustra.
O desfecho decepciona e desconcerta pela obviedade e pelo fato de o dramaturgo e seus personagens terem permanecido externos ao fenômeno, impermeáveis a ele.
A exposição de vários artistas plásticos, no ambiente que circunda o espaço cênico, revela-se mais contundente no tratamento do tema do que a dramaturgia.
Esta fica encapsulada em falas que racionalizam o autismo, sem transcender o anedótico e alcançar o encanto do ainda ignoto.


A MÁQUINA DE ABRAÇAR
QUANDO
de hoje a sáb., às 21h30; e dom., às 20h; até 6/6
ONDE Sesc Pompeia (r. Clélia, 93, tel. 3871-7700)
QUANTO de R$ 4 a R$ 16
CLASSIFICAÇÃO 16 anos
AVALIAÇÃO regular



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