São Paulo, sábado, 04 de abril de 2009

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"René" mostra 20 anos na vida de um prisioneiro

Diretora acompanhou personagem que escreveu três livros em cadeia tcheca

Helena Trestikova conta, em entrevista à Folha, por que decidiu filmar a vida de René mesmo depois de ter seu apartamento roubado por ele


CRISTINA FIBE
DA REPORTAGEM LOCAL

Ao acompanhar por quase 20 anos um personagem viciado em transgredir as leis da República Tcheca, a diretora Helena Trestikova, 59, virou mãe, amiga, mantenedora e vítima. René Plasil, objeto do documentário que leva seu nome, tinha 17 anos quando a cineasta participou de projeto em uma prisão tcheca para menores de idade, em 1988. Fez quatro filmes, sobre quatro meninos delinquentes -um deles terminou com o roubo ao apartamento da diretora, em 1992, um "presente" de René.
"Achei aquilo fora do comum. Seria uma pena parar de observar um personagem desses. Senti isso como um tipo de mensagem", diz Helena, que visitou SP durante a semana para participar do É Tudo Verdade, que exibe seu filme hoje. Ela então escolheu René para o projeto de longo prazo. Registrou sua personalidade mudando (para pior), seu corpo se enchendo de tatuagens raivosas, sua solidão aumentando e, finalmente, a publicação do primeiro dos três livros que escreveu na cadeia. Apesar de dizer que nesse tipo de filme "o diretor não tem nenhuma influência sobre o objeto", Helena o ajudou, não só dando a ele livros como levando a editoras os escritos de René. "Eu tentava dar impulsos, mas a decisão era dele", diz.
Além do apoio "espiritual", Helena deu a ele um cachê, "como se faz com qualquer ator", para que recebesse suas visitas dentro e fora da cadeia -mais dentro do que fora, diga-se. Até 2007, ano de conclusão das filmagens, René não conseguia ficar mais do que alguns meses em liberdade -como diz Helena, ele "não atravessava a rua para ganhar dinheiro", preferia roubar. Até os próprios livros ele furtou de uma biblioteca, certa vez, já que os tinha esquecido na cadeia.
Mas, após o lançamento do filme na República Tcheca, pouco depois de ser solto pela última vez, René ainda não foi preso de novo, um recorde. "Ele está numa situação nova, diferente. De uma pessoa desesperada, transformou-se em herói. Chamou a atenção principalmente das mulheres que querem "salvar" esse tipo de homem. Estou sentindo que ele começa a redefinir sua relação com o mundo", afirma Helena.
No momento, enquanto enfrenta uma esclerose múltipla (ou tenta ignorá-la), o personagem viaja por seu país para divulgar o documentário e receber "pouco dinheiro, mas honesto", embora ninguém saiba o quanto o respiro pode durar. Helena, por sua vez, além de divulgar "René" pelo mundo (o filme já foi exibido em várias cidades da Europa, na Coreia e na Argentina), trabalha em suas próximas criações -por exemplo, um documentário que observou por 13 anos uma viciada em drogas e outro, sobre moças que estudaram enfermagem, feito durante 20 anos.


RENÉ

Direção: Helena Trestikova
Onde: hoje, às 17h, e amanhã, às 19h, no Cinesesc

NO BLOG - Leia a íntegra da entrevista com Helena Trestikova folha.com.br/ilustradanocinema



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