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Bacon inspira destaques de festival
Série de fotografias e coreografia desta edição do Cultura Inglesa visitam universo soturno e distorcido do pintor irlandês
Outros destaques da 14ª edição, como a animação "Tempestade" e uma instalação, são inspirados em canções dos Beatles
SILAS MARTÍ
DA REPORTAGEM LOCAL
Sorte dos britânicos de ter vivido em Londres um artista como Francis Bacon. A histeria
nervosa do pintor, traduzida
em suas telas em corpos contorcidos, carcaças animais e
rostos desfigurados, é chave de
dois dos maiores destaques da
14ª edição do Cultura Inglesa
Festival, série de exposições de
artes plásticas, teatro, dança e
cinema que começa hoje.
"Bacon tem sido uma figura
constante no festival", diz
Laerte Mello, diretor de programação, à Folha. "Ele acabou
ficando popular por aqui."
Com a premissa de que os
trabalhos mostrados no festival precisam ter raiz conceitual
em artistas ou questões britânicas, Bacon, irlandês radicado
na Inglaterra, é mote favorito
agora. Também há espaço para
os surrados Beatles e Shakespeare -acaso feliz de o Reino
Unido ter arrolado em sua história um casting expressivo para esse tipo de proposta.
Logo na entrada do Centro
Brasileiro Britânico, em Pinheiros, está uma tradução fotográfica das pinturas de Bacon. Edouard Fraipont mostra
uma série de imagens de um
casal que se contorce na cama.
Analógicas, resultado de exposições de até 15 minutos, são
fotografias com peso de quadro. Texturas e detalhes sob luz
controlada, soturna, parecem
galgar a densidade da tinta.
"Ele construía a pintura dele
e criava acidentes, acasos dentro do quadro", descreve Fraipont. "Também criei acidentes
com o corpo dessa construção."
Tanto em Bacon quanto nessa releitura de Fraipont, é um
erotismo sujo que está em jogo.
Não é o erótico do sexo, mas de
Eros, pulsão de vida que se debate aqui num amálgama de
pele agitada, flagelo amoroso.
"É um pouco histérico, nervoso", resume Fraipont. "Não é
um erotismo atraente."
Nos retratos, rostos distorcidos, com olhos e bocas que se
confundem, Fraipont retoma
aspectos cubistas e expressionistas do trabalho de Bacon.
Foi, aliás, um retrato do pintor, em pé diante de duas carcaças de porco penduradas do
teto, que levou à construção da
coreografia "Um Porco Sentado", maior destaque de dança
desta edição do festival.
Roberto Alencar e Renata
Aspesi traduzem a imagem de
John Deakin em que a carne
suína parece ser asas nas costas
de Bacon, numa coreografia
sem narrativa nem trilha sonora. "Toda sensação é nova, causa estranheza", diz Laerte Mello. "É quase uma instalação."
E se a dança se apropria das
artes visuais, o artista Carlos
Nunes usa a música dos Beatles
para fazer dançar um conjunto
de balões numa caixa de acrílico. São pontos coloridos que
flutuam sobre ondas sonoras
do disco "Yellow Submarine",
desenho clássico que terá um
remake feito pela Disney.
Trocando de álbum, a animação "Tempestade", toda feita
com massinha de modelar, estrutura sua narrativa em torno
dos versos de "Eleanor Rigby".
Fora da música, obras do artista João Loureiro relembram
Phillip King, Tim Scott e William Tucker, trio que revolucionou a escultura no Reino
Unido nos anos 60 com cores
vivas e materiais industriais.
Loureiro recria obras deles a
partir de fotografias em preto e
branco de uma exposição clássica em Londres. Mas o truque
é mecânico: as obras, montadas
sobre motores, vão se mexer
para sublinhar a instabilidade
entre real e reprodução.
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