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São Paulo, sábado, 08 de março de 2003

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CINEMA

Ciclo no Centro Cultural São Paulo reúne filmes realizados por diretoras brasileiras, como "Tônica Dominante"

Produção feminina está ainda no "quase bom"

Divulgação
Fernando Alves Pinto e Vera Holtz em cena do filme "Tônica Dominante", atração da mostra Cinema de Mulheres no CCSP


NINA HORTA
COLUNISTA DA FOLHA

Chamam-se festivais de cinema, mas são maratonas, principalmente se você estiver interessado em formar uma opinião geral dos filmes. Assisto, como simples espectadora, não como cozinheira (que sou) nem como crítica (que não sou).
São filmes de diretoras, mulheres, e consigo ver: "Patriamada", "Eternamente Pagu", "Copacabana", "Como Ser Solteiro", "O Casamento de Louise", "Bananas Is My Business", "Revolta dos Carnudos", "Brava Gente Brasileira", "Terra para Rose".
Fiquei pensando, de olho parado, no que teriam em comum essas mulheres e seus filmes. Cheguei à conclusão rápida e superficial de que:
1 - Gostam muito do Rio de Janeiro e bobas são -nada como o Rio como ator para roubar todas as atuações e falas. A cidade solapa tudo na sua boniteza postal.
2 - Todas assistiram às chanchadas brasileiras, gostaram e guardam um pouquinho delas para citá-las nos filmes que fazem.
3 - São brasileiras até mais não poder e preocupadas com a sorte do Brasil. Querem fazer filmes que mudem o Brasil. Esse talvez não seja o melhor jeito de fazer bons filmes... e de ajudar o país não sei.
4 - São apaixonadas por um documentário com voz em "off". A voz nem sempre com um tom bastante nostálgico e triste, que incomoda, consegue até baixar uns decibéis da esfuziante "Brazilian Bombshell". Por pouco a Carmen Miranda chora.
5 - Todas fizeram um filme "quase muito bom". São especialistas em filmes quase bons, o que já é muito. Ótimo, mesmo, autêntico, saído do coração, não vi nenhum, irregulares, um pouco cansativos.
Começam bem, vão perdendo o embalo, ou se extraviam, deixam a gente com um gosto de quero mais na boca. Não são redondos, não se sai do cinema cantando ou chorando, ou mesmo sorrindo por dentro.

Poesia dominante
Agora, o último filme da mostra é "Tônica Dominante", nada comercial, é verdade, peguei em DVD. E se é para ser chato, vamos ser chatos enormes, monumentais, como Godard.
Não dá para acreditar que seja o primeiro longa-metragem de uma mulher que nem cineasta era, mas clarinetista das boas, Lina Chamie. Se você é dessas pessoas que quer entender completamente um filme, não vá.
É filme de sentir. Lindo, um poema, onde a música rasga o vazio, o tempo, a solidão, o deserto, e vai sozinha bordando em azul, vermelho e dourado o filme e o mundo.

A música acima de tudo

Boy e girl se encontram, se olham, se desentendem, se entendem, mas a palavra não tem vez, não dão a menor pelota para a palavra, só para a imagem e a música, e que imagem, e que música! Só pode falar o maestro, o organizador, o que rege as altas esferas.
Os outros personagens são fragilizados vasos da poesia, criaturas tomadas pelo imenso mistério da arte, pequenos seres que lutam com a angústia do belo, do tempo, que se debatem com a técnica, que tropeçam no tapete, são assaltados, atendem o estridente telefone, viram páginas de partituras.
Suas armas? São seus instrumentos detalhados, formalizados, amados, respeitados,vasculhados peça a peça, veículos predestinados do cantar do artista, coisas amadas, lustradas, são eles afinal que vão um dia dar ao mundo a luz. E o artista caminha pela cidade, envereda pelo escuro das vielas para sair no fim do túnel. Enfim, o brilho.
Eu não sei explicar esse filme, tenho ouvido ruim, a voz poética não cala em mim como deveria calar, seria ir além de meus próprios tamancos, vá você ao festival, ou compre o DVD, e assista duas vezes por dia até ele entrar em você e ficar fazendo parte de sua procura.


CINEMA DE MULHERES - Mostra que apresenta filmes brasileiros de várias épocas dirigidos por mulheres. Onde: Centro Cultural São Paulo (r. Vergueiro, 1.000, Paraíso, zona sul, tel. 3277-3611, ramal 221). Quando: até o dia 2 de abril. Quanto: grátis (os ingressos deverão ser retirados uma hora antes do início da sessão).


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