São Paulo, terça-feira, 13 de julho de 2004

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CINEMA/"ESPELHO D'ÁGUA"

Filme faz retrato superficial de temas caros ao Nordeste brasileiro

CLAUDIO SZYNKIER
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Há um seleto grupo de filmes sobre fotógrafos e seu ofício. Nele, se incluem obras como "Janela Indiscreta" e o fake dos fakes de Antonioni, "Blow Up". "Espelho d'Água", de Marcus Vinicius Cezar, faz parte desse grupo.
Em "Blow Up", um fotógrafo reforma e deforma uma imagem para ver aquilo que seus olhos não capturaram, mas sua máquina, sim. Se Antonioni, passeando feliz e indolente pela banalidade, reitera que a realidade no cinema é um desejo (ou um pavor), Cezar verifica que essa realidade é um catálogo de agência de viagens.
Henrique (Fábio Assunção) viaja o São Francisco para produzir um livro com fotos do rio, no que é hostilizado. O fotógrafo, em conflito, estaria confeccionando documento insosso, registrando superfície e beleza em um universo no qual distorções existem e são sérias. Radiantes e inofensivas, as imagens de Assunção são, em geral, incapazes de desordenar paradigmas. As de Cezar seguem esse rumo.
Em "Espelho d'Água", há uma canoa falante, lendas e cultura popular nas ruas. Assim, Cezar dará estofo folclórico a uma história de moral ecológica, que resvalará no mistério. Essa construção, no entanto, irá resultar em uma versão turismo, de fato superficial, para temas tão entranhados na geografia que o filme percorre.
Os fracassos estruturais do filme (roteiro e decupagem) são relevantes, mas o que chama a atenção é a forma com que são processados os espaços. Em "Espelho d'Água", ambiência é paramento. Serve para carregar traços culturais regionais, formatados quase na via estética do institucional. Serve também para honrar o que seria um projeto cinematográfico, em voga, de exaltação de uma suposta identidade brasileira.
Os ambientes, diferentemente de "Respiro", de Emanuele Crialese, jamais irão encurralar, inflamar ou soldar-se aos personagens em suas experiências físicas ou emocionais. É o cinema quando não consegue mergulhar.


Espelho d'Água
 
Direção: Marcus Vinicius Cezar
Produção: Brasil, 2003
Com: Fábio Assunção, Carla Regina
Quando: em cartaz no Espaço Unibanco, Jardim Sul, Lumière e SP Market



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