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CINEMA
A diretora francesa Catherine Breillat explica por que incluiu cenas de sexo explícito em seu filme
"Romance" não é um grande amor
CELSO FIORAVANTE
da Reportagem Local
"Romance" tem tudo para impressionar (ou provocar tédio).
Dirigido por Catherine Breillat, o
filme francês vem recheado de cenas de sexo explícito (masturbação, felação, penetração, sadomasoquismo etc.), abusa da verborragia dos personagens e conta
com a presença de um astro do cinema pornô: o bem-dotado Rocco Siffredi.
Em entrevista à Folha, a diretora Catherine Breillat explicou a
necessidade das cenas de sexo explícito do filme e falou sobre o uso
de dublês e a atuação do astro
pornô Siffredi.
Folha - Seu filme se chama
"Romance", mas quase não vemos romance nele. Por que esse
título? Que tipo de romance você está procurando?
Catherine Breillat - O romance,
ao contrário do que acreditamos,
é uma coisa que queremos viver,
algo para o qual estamos prontos
e sem qualquer exigência. Um romance não é um grande amor. É
algo que nos engana, fazendo
acreditar que é amor, mas que,
em seguida, não contém seus ingredientes. Não estou dizendo
que ele não tem importância, mas
que ele não tem exigência. É algo
que, depois do tempo da ilusão,
traz o tempo da desilusão. O romance é uma amor ilusório, não é
um verdadeiro amor. Mas temos
tanto desejo de viver um amor,
mesmo ilusório, que creditamos
ao romance uma importância
muito grande.
Folha - E, no filme, Marie quer
um romance?
Breillat - No começo do filme
ela vive o fim de um romance, que
termina com sua desilusão e a degradação de si mesma. É sempre
assim. Acreditamos que é amor
aquilo que não passa de desejo de
amor. Marie não ama Paul. Ele é o
objeto de seu amor, mas não é o
sujeito de seu amor.
Folha - Que tipo de motivação
a levou a incluir cenas de sexo
explícito no filme?
Breillat - Foram duas motivações: uma de autor e outra relacionada à dignidade humana. Todos fazemos sexo explícito, mas
temos a impressão de que não se
trata da mesma coisa que vemos
no cinema pornográfico.
Assim sendo, pensei que o cinema de autor deveria desmistificar
o sexo explícito e mostrar que não
se trata apenas de imagens, mas
também de sentimentos.
O cinema é a arte que dá senso e
emoção às imagens e, por isso, deveria reintegrar as imagens pornográficas em um cinema de autor para dar-lhes um sentido diferente. Quando eu digo cinema de
autor, quero dizer cinema tradicional.
Esse tipo de imagem esteve reservada ao que chamamos cinema "X" (sigla que identifica filmes
pornográficos), mas que sequer é
cinema. Trata-se de uma indústria do sexo, não mais do que isso.
O cinema "X" é a prostituição
do sexo. O cinema pornográfico
não é uma visão do sexo definitiva, apesar de ser praticamente a
única que temos atualmente.
Pensei então que seria absolutamente necessário criar uma outra, que não seria apenas um direito, mas um dever dos autores.
Trata-se de um campo imenso de
pesquisa e reflexão para o futuro.
"Romance" não é uma visão do
sexo. É uma procura de uma
identidade pessoal por meio do
sexo. Não é sobre o prazer, embora ele conte também.
Folha - A escolha de Rocco Siffredi para um dos papéis não remete o espectador para esse tipo de indústria pornográfica?
Breillat - Sim, mas acredito que
a sua importância ultrapassou a
indústria pornô. Eu diria que,
apesar de ele fazer filmes pornôs,
os espectadores lhe rendem uma
atenção impensável para alguém
que faça filmes pornôs. Ele é um
dos mistérios do filme. Ele não foi
aviltado por aquilo que faz. Ele é
uma das poucas estrelas do filme
pornô que ultrapassa essa fronteira. Ele não é um pária da indústria
e dá uma nova luz ao filme.
Folha - Você acredita que ele
seja um bom ator?
Breillat - Ele é um bom ator,
mas não foi um bom ator imediatamente. Foi necessário que ele
aprendesse tudo. Ele pensava que
apenas a falta de inibição física seria suficiente, mas não foi. O ator
deveria promover o exibicionismo de seus sentimentos e de sua
alma, algo que ele não compreendia, mas aprendeu muito rápido.
É um bom ator, mas que tem
muito a aprender, e eu não pude
ensinar-lhe tudo, pois o papel não
era grande o bastante.
Folha - Você usou dublês nas
cenas pornográficas?
Breillat - A cena em que as pessoas apareciam divididas em duas
foi feita com dublê, uma atriz do
cinema pornô. A atriz principal
aceitou um certo número de coisas, mas não se trata de uma atriz
pornô e, por isso, não a obriguei a
fazer o que não quisesse.
Filme: Romance
Produção: França, 1998, 95 min.
Direção: Catherine Breillat
Com: Caroline Ducey, Sagamore
Stevenin, Rocco Siffredi e outros
Onde: Espaço Unibanco 2 (14h10, 16h,
18h, 20h e 22h), Ipiranga 2 (desde
13h30), Belas Artes Villa-Lobos (desde
14h), Studio Alvorada 1 (desde 14h) e
Morumbi 5 (desde 16h)
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